A história deste mito, começa assim: Orfeu
era um músico talentoso que desceu ao submundo grego, para resgatar sua esposa
Eurídice, que havia morrido. Chegando lá, com o poder de sua música, ele encantou
Hades, que era o rei do submundo, e obteve a permissão para levar Eurídice de
volta ao mundo dos vivos, mas, Hades lhe determinou duas condições, a primeira,
que reflete a situação cultural da mulher grega, a de que Orfeu iria à frente e
Eurídice, atrás, seguindo Orfeu. A segunda condição, foi a de que Orfeu não
deveria olhar para trás, até que ambos estivessem fora do submundo. Acontece
que, na divisa entre o submundo e o mundo, com muitas dúvidas, Orfeu olhou para
trás, e, repentinamente, Eurídice desaparece voltando para o submundo, para
sempre.
Outro mito semelhante, se encontra no
livro do Gêneses, no capítulo 19, versículos de 1 a 8, é o caso da mulher de
Ló. Ele e sua família, foram avisados para fugir de Sodoma antes que ela fosse
destruída por Deus, por causa da maldade que lá estava instalada. O anjo falou:
Vai, salva tua vida, não olhes para trás e não pares nos arredores! Esconde-te
nas montanhas, para que não sejas destruído”... Todos os membros da família
foram instruídos, que durante a fuga, não podiam olhar para trás. Mas, a mulher
de Ló, desobedeceu e olhou. Em função disso, foi castigada e transformada numa
estátua de sal. O que se percebe nessas duas passagens, tanto na religião grega
como na religião cristã, é que a moral da história nos diz que não se deve
olhar para trás.
Ambas as histórias conotam as seguintes
questões: a importância da confiança e da obediência aos comandos divinos; o
olhar para trás, que simboliza o apego ao passado, a dúvida e a desobediência e
suas possíveis consequências. A frase “não olhar parar trás”, revela-se como
uma metáfora para a necessidade de seguir em frente, deixando o passado para
trás. Assim, o ato de olhar para trás é interpretado como um sinal de apego às
coisas materiais e à vida passada. Portanto, o mito de Orfeu e Eurídice e a
história da mulher de Ló, retratam um tema central: a proibição de olhar para
trás, o que significa dizer que em ambas situações, olhar para trás, resulta em
trágicas consequências.
O que está em jogo, nestas passagens é que
está implícito uma ideia patriarcal, dominante e misógina de que a mulher não
deve olhar para o passado, como também as demais pessoas. E é assim que, muitas
vezes, a história inviabiliza determinadas figuras, cria preconceitos e
apagamento da memória feminina e muitas vezes, a ausência de grandes
personagens da história. Conota ainda, um desprezo pela desobediência do sexo
feminino, semelhante ao que aconteceu com Eva, quando comeu do fruto proibido e
que também infringiu a lei de Deus. O interessante é que, na construção dessas
histórias, sejam religiosas ou culturais, a mulher sempre é apresentada como um
problema e não como uma solução, como por exemplo, o caso de Pandora, que abriu
uma caixa e deixou todos os males sair para afligir os homens. A questão é que,
as afirmações desses mitos contrariam completamente o conhecimento científico,
quando temos que estudar o passado, com a intenção de nos fundamentarmos, para
entender o presente e o futuro. Os cânones do conhecimento científico nos dizem
que o segredo é exatamente esse, aprender com o passado, para seguir preparado
para o futuro.
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