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quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Bonequinha de Pano

BONEQUINHA DE PANO
Por Romualdo Palhano.

Desprovido de apoio dos órgãos públicos...!? É assim que a “Companhia Oi Noiz Aqui Traveiz” produziu e trouxe ao palco do Teatro das Bacabeiras para o deleite do público infantil do Estado do Amapá, o espetáculo infantil “Bonequinha de Pano” com texto de Ziraldo e encenação de Cláudio Silva.
Se por um lado, este fato nos revela a ausência constante dos órgãos de cultura em relação aos pequenos produtores culturais em nosso Estado, por outro lado, denota a persistência de um grupo de teatro que se torna independente e busca prosseguir seu trabalho a caminho da profissionalização.
É um espetáculo instigante, tanto pelo tema abordado pelo dramaturgo Ziraldo, como também pelo seu teor filosófico tendo em vista que parece ser uma peça teatral para todas as idades em função de que discute o meio termo do ciclo vital de uma menina/adolescente/mulher.
Praticamente todo o espetáculo tem a presença da boneca Pitucha (interpretada por Sabrina Zahara) como personagem principal. Ela mesma narra os problemas pessoais da Leninha (sua dona) quando criança e adolescente e imagina seu estágio de adulta. Revela momentos de transição da personagem e mudanças repentinas, tanto relativas às questões sociais vividas por Leninha (como a separação de seus pais e a obrigação de morar com a avó), como os dissabores e as alegrias de enfrentar a constante metamorfose em seu próprio corpo como, por exemplo, o fenômeno da menarca.
É um espetáculo de difícil concepção levando-se em consideração ser um trabalho voltado para um público adolescente e ainda por apresentar apenas um personagem em cena, revelando-se num monólogo. Se já é difícil montar um espetáculo solo para adultos, imagine montar um monólogo para crianças? Mas, isso não vem ao caso, visto que a atriz que atua na peça, Sabrina Zahara já vem se revelando no teatro amapaense como foi o caso de “Cordel do Amor Sem Fim”.
Basta dizer que em uma hora e sete minutos, ela, a atriz Sabrina Zahara, consegue reter a atenção do público infantil e adulto presente na platéia ao manter firme e coerente sua interpretação, convencendo sua verdade teatral no palco como a boneca Pitucha e como Leninha, já no final do espetáculo. Em relação à manipulação dos bonecos, Sabrina conseguiu criar a expressão necessária para dar vida aos seus bonecos, demonstrando leveza e concentração com o intento de convencer o público. Em função da distância entre palco e platéia, penso que os referidos bonecos poderiam ser maiores, ou no caso, ser recompensado com iluminação incisiva.
O espetáculo “Bonequinha de Pano” apresenta um cenário que tem como ponto de partida a própria necessidade da encenação... Sem exageros...! Dessa forma, convence por sua singularidade e originalidade. Acredito que Bruno Nunes que assina o projeto cenográfico e a concepção do figurino tenha entendido o teor espetacular do texto. Ainda em relação aos bonecos usados no espetáculo, evidentemente na cena em que Pitucha faz Leninha cantar e dançar há necessidade de mais trabalhos técnicos por parte da atriz manipuladora Sabrina Zahara. Nesta cena a iluminação poderia concentrar-se apenas no mamulengo.
O espetáculo cai um pouco na cena final em detrimento da lentidão na mudança de cenário. Este é um momento crucial da peça que precisa ser revisto pelo encenador. Instante decisório que faz parte do espetáculo e que não está ao alcance do público. Nesse caso, há necessidade de se determinar um tempo mínimo entre fechar as cortinas, mudar o cenário e abri-la em seguida. Este é um fator preponderante para a visualização da encenação como um todo, como também para corroborar com esse momento mágico presenciado pelo público. Principalmente no que diz respeito ao ângulo de visão, tanto da boneca Pitucha como também por Leninha e ainda do espectador.
Essa mudança de cenário poderá inclusive envolver muitas pessoas e funciona como o “Pit Stop” na fórmula I que é a parada para troca de pneus e reabastecimento que exige horas de treinamento e chega a contar em muitos casos com um grupo de até 25 pessoas para concentrarem-se num tempo recorde de 5 a 8 segundos. Portanto há que se ensaiar a mudança do cenário (como se ensaia uma cena, várias vezes) para se chegar ao mínimo de tempo possível para assim tornar-se ainda mais mágico e ritmado o espetáculo. Com trabalhos deste nível a peça poderia concentrar seu tempo cronológico em pelo menos 50 minutos, o que seria ideal em função de seu tema e do seu público.
Como Leninha, o espetáculo “Bonequinha de Pano” é um trabalho que está em constante transformação, metamorfoseando-se, e a meio caminho da profissionalização. A música ao vivo concebida por Cléverson Baía complementa a unidade da peça, pena que o sistema de som em alguns momentos interfira diretamente na propagação do som, o que vem a atrapalhar de certa forma a atuação de Sabrina quando está cantando. Quem assume este trabalho é o Grupo “Ói Noiz Aqui Traveiz”, sendo direção de Cláudio Silva; interpretação de Sabrina Zahara; assistente de direção e iluminação – Dan Alves; execução de cenários - Wagner Ribeiro; adereços – Agostinho Josaphat; concepção de figurinos: Rosa; programação visual – Hedvaldo Silva; e direção de palco de Washington Silva.

Doutor e Pós Doutor em Teatro.

sexta-feira, 1 de julho de 2011


DIÓGENES E SEU TONEL
                                        Por Romualdo Palhano

     Diógenes foi um antigo filósofo grego. Viveu entre 413 e 323 a.C. Sua filosofia de vida girava em torno do desprezo por qualquer tipo de prazer e o completo domínio do corpo. Era cético e cínico e tinha um feroz gosto pela sátira e pelo paradoxo. O Ceticismo (literalmente busca) é uma tendência filosófica também conhecida como Pirronismo, que indica uma atitude de pensamento que eleva a dúvida de sistema, na convicção de que não existem afirmações seguras. Era iconoclasta e contrário a qualquer forma de erudição e até mesmo de cultura e preferia exprimir-se por meio das ações cotidianas em vez de textos escritos.
     Ao lado do amigo Anaxarco, filósofo seguidor de Demócrito, acompanhou Alexandre Magno na expedição ao Oriente de 334 a 324 a.C. Na Índia teve oportunidade de conhecer os filósofos gimnossofistas – termo que literalmente significa que alcançam a sabedoria por meio do corpo -, hoje conhecidos como mestres de yoga.
     Algumas perguntas de Diógenes: como se deve viver? A cultura é importante? Em que consiste a virtude? Diógenes tinha o seguinte estilo de vida: vivia em um tonel; rejeitava qualquer comodidade; vestia apenas uma túnica e bebia água das poças, como um cão, por isso também foi taxado de Diógenes, o cão.
     Em função de que andava pelas ruas de Atenas, em pleno dia, levando uma lanterna na mão, também o apelidaram de “Sócrates, o Louco”. Ele era sem cidade, sem teto, banido da pátria, mendigo, errante e em cotidiana buscar por um pedaço de pão. Costumava dizer que opunha à fortuna a coragem, à convenção a natureza, à paixão a razão.
     Em sua vida cotidiana Diógenes possuía apenas seu tonel que era sua casa e uma tigela para beber água. Certa vez viu uma criança bebendo água na concha das mãos e jogou a tigela dizendo: -  Um menino me deu uma lição de simplicidade.
     Certo dia quando tomava sol diante do seu tonel se deparou com a figura de Alexandre Magno que, por ter ouvido sobre a sua famosa forma de viver, resolveu visitá-lo. Alexandre que estava acompanhado de sua guarda governamental falou: - Grande filósofo Diógenes, sobre tudo o que há no meu reinado, pede-me o que desejas que eu concretizo o teu pedido. Diógenes olhou para Alexandre e simplesmente disse: - Gostaria que o senhor afastasse um pouco e devolvesse o meu sol.  Todos os guardas caíram na gargalhada. Alexandre pediu para que eles calassem e assim falou: - Seu eu não fosse Alexandre gostaria de ser Diógenes.

Doutor e Pós-Doutor em Teatro.
03 de julho de 2011, Jornal A Gazeta - Macapá.