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segunda-feira, 28 de agosto de 2023

DESTINO MACAPÁ - PORTÃO 2

 


     No ano de 1993, me submeti a concurso público na Universidade Federal do Pará. Em fevereiro de 1994 tomei posse e comecei meus afazeres como professor de artes do ensino fundamental e médio, na escola de aplicação, denominada de Núcleo Pedagógico Integrado, mais conhecida como NPI, daquela tão significativa instituição. Era uma escola muto requisitada. A experiência foi muito gratificante na minha vida; em muito aprecio a cidade de Belém do Pará, mas, sou um caboco que não gosta de cidade grande, e, por ser uma cidade de vultuosa, foi difícil me adaptar em Belém. Frente a tudo isso, lá, passei apenas o ano de 1994.

     Interessante é como foi trilhado o caminho para que eu viesse fincar morada nas terras tucujus.  Tudo começou com minha inscrição para participar e apresentar artigo científico no VII Congresso da Federação de Arte Educadores do Brasil – CONFAEB, que aconteceu no mês de julho do ano de 1994, na cidade de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul. Tudo correu de acordo com o previsto: instalação em hotel, recepção na secretaria do congresso, trabalho de participação nas assembleias políticas; participação em várias apresentações de colegas de outros estados e, enfim, apresentação de trabalho científico, como foco de participação do referido congresso. Foi uma semana muito proveitosa, principalmente nos contatos efetivados.

     Congresso finalizado, inicia-se os protocolos de retorno, feito o check-in, trecho de Campo Grande a São Paulo; até aqui tudo bem, mas, o interessante é que os caminhos para que eu pudesse chegar até Macapá, começaram a acontecer exatamente no voo de São Paulo para Belém. Nessa época, as aeronaves faziam esse trecho, basicamente num período de quatro horas. Um voo bastante longo. Era tempo suficiente para discutirmos determinados assuntos da área da arte educação e da arte. Acontece que terminei entrando numa conversa, onde já estavam alguns professores do Curso de Artes da Universidade Federal do Pará, os quais, eu já os conhecia, como Neder Charone, Edilson, além de mais dois que não me recordo nesse momento. Portanto, havia nesse debate um outro professor que, naquela ocasião, a mim foi apresentado; ele era, o coordenador do Curso de Educação Artística da Universidade Federal do Amapá.  

     Entretanto, já na metade da viagem, enquanto os demais professores da UFPA, foram tirar uma soneca; passei a conversar, trocar ideias e conhecer o, então, coordenador do Curso de Educação Artística da UNIFAP, professor José Alberto Tostes. Naquele momento, fiquei deveras feliz em saber que a Universidade Federal do Amapá, estava recém implantada. Só sei que num determinado momento ele me falava das perspectivas de progresso daquela instituição e de que, ele próprio, havia sido aprovado em concurso que acontecera no ano de 1993. E assim, de forma satisfatória, fui ouvindo calmamente sobre a conquista da implantação da UNIFAP. Não obstante, prof. Tostes começou a me informar de um novo concurso, o qual, em breve seria publicado o edital, que, inclusive havia uma vaga para um profissional na área do teatro, para suprir a necessidade da disciplina com o mesmo nome. 

     Saí dessa conversa decidido em galgar uma vaga naquele pleito. Publicado o edital do concurso, enviei os documentos necessários à inscrição e, muito ansioso, me submeti ao mesmo. As provas aconteceram em setembro. Fui aprovado em primeiro lugar geral daquele certame, visto que eu era o único candidato, que na ocasião, possuía o título de Mestre, acredito que este fato tenha contribuído e muito para galgar esse patamar. O concurso foi homologado em novembro, e, vários colegas de Macapá assumiram naquele mesmo ano; como tive que concluir minhas disciplinas na UFPA, no dia 02 de janeiro de 1995, tomei posse no antigo Departamento de Pessoal da UNIFAP.

terça-feira, 22 de agosto de 2023

ATMOSFERA CONTA MARIA FIRMINA

 


     Último dia 11, às 19 horas, estive no salão de eventos do SESC/Araxá para contemplar o espetáculo teatral, proveniente do Maranhão, Maria Firmina dos Reis, Uma Voz Além do Tempo, dentro da programação do SESC/Amazônia das Artes – 2023. Aliás, é bom registrar aqui, e parabenizar este excelente projeto do SESC/Amapá, o qual, faz circular espetáculos teatrais produzidos por artistas da região, nos estados da Amazônia legal brasileira.

     Por outro lado, vale assinalar que há três décadas que a sociedade amapaense espera ansiosa por um pequeno teatro de bolso de 256 lugares, o qual foi prometido e projetado pelo próprio SESC, mas que não saiu do papel. Na falta deste tão precioso espaço, houve tentativas, como exemplo, por iniciativa do Setor de Cultura, que aproveitou uma sala abandonada, e criou o Teatro Porão, que funcionou por um determinado período e que infelizmente foi desativado. É em função disso, que os espetáculos, em geral, continuam sendo apresentados no salão de eventos daquela instituição.

     Voltando ao espetáculo em pauta; é resultado de uma pesquisa do Núcleo Atmosfera de Dança-Teatro, sobre Maria Firmina dos Reis, poetisa, professora e escritora maranhense e, considerada a primeira romancista negra do Brasil, que viveu entre os séculos XIX e XX. A dramaturgia e consequentemente o espetáculo, conta a história dessa professora do interior do Maranhão e nos remete à luta política, do Teatro de Arena de São Paulo, na década de 1960, com seus espetáculos: Arena Conta Zumbi; Arena Conta Tiradentes, entre outros. Acredito que o referido trabalho do Núcleo Atmosfera também poderia ser cognominado de: Atmosfera Conta Maria Firmina.

     Seria interessante! Tendo em vista que a dramaturgia se insere na estética do teatro épico e didático, de Bertold Brecht, já que conta e narra uma história, com seus problemas culturais, suas contradições, suas causas e seus efeitos, que se revela, notadamente, na luta de classes. Em suma, a carpintaria teatral do texto e do espetáculo, utilizando-se do distanciamento brechtiano, leva o espectador a cogitar, raciocinar, pensar e refletir politicamente, a partir da fala da única personagem que é a própria Maria Firmina, que, a todo tempo, põe em questão as mais diversas formas de discriminação que persiste na sociedade contemporânea e brasileira. O monólogo, interpretado por Júlia Martins, não só, faz o público refletir, como também o incentiva a se expressar verbalmente, quando numa das cenas, a plateia repete significativamente, a seguinte frase: negro não é animal para se montar em cima dele. Ícones relevantes da essência do teatro dialético.

     Cenário e iluminação se harmonizam para corroborar plenamente com a dramaturgia e a interpretação. O cenário é composto por quatro praticáveis móveis, circundados de um tipo de tecido bastante parecido com crochê ou rede de dormir e multicoloridos, que juntamente com a iluminação, são realçados a cada momento, refletindo e refratando determinadas cores, dependendo das falas da personagem, com fortes tonalidades. Esses praticáveis, ao passo que, durante o desenvolvimento da peça, permanecem na vertical, realçando estabilidade e determinação, no epílogo são colocados na horizontal, o que demonstra instabilidade e insegurança, significando, por sua vez, o constante sofrimento dos menos favorecidos e discriminados pela sociedade atual.

     Júlia Martins, interpreta Maria Firmina, com direção de Leônidas Portella. A concepção do cenário, é de Marlene Barros e Marcos Ferreira que também assume o figurino juntamente com Desalinho. A confecção do figurino ficou a cargo de Ed Lima Crochê, Marcos Ferreira e João Vinícius. Na iluminação, Renato Guterres; e trilha sonora de Beto Ehongue; e Identidade Visual: Tassila Custodes e Emia Jedudu.

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

PALHAÇO JAMELÃO

 


     Em vários níveis como graduação, a partir do Trabalho de Conclusão de Curso – TCC; Mestrado, tendo como ponto de partida a Dissertação e doutoramento, como é de praxe, com a defesa da Tese, várias pesquisas científicas sobre artes cênicas do Amapá, vem sendo desenvolvidas e crescendo paulatinamente, após a implantação do Curso de Licenciatura em Teatro da UNIFAP, que se deu em 12 de novembro do ano de 2014. Ainda no Curso de Educação Artística e Artes Visuais, passei a orientar alguns trabalhos, como por exemplo um sobre a peça Bar Caboclo e outro sobre as Visualidades Cenográficas do espetáculo Uma Cruz para Jesus.

     Recentemente foi defendido um TCC sobre um famoso palhaço que rondava a cidade de Porto Grande em épocas passadas. Chamava-se Palhaço Jamelão, e era muito conhecido tanto na cidade de Porto Grande como nos arredores. Este trabalho de pesquisa vem contribuir ainda mais com o objetivo de transformar em documentos e deixar esse legado na memória do povo amapaense. Intitulado: História do Teatro Amapaense: Construindo a Memória do Palhaço Jamelão, sob minha orientação, foi realizado pelo acadêmico do Curso de Teatro, Fábio Pereira dos Santos, que também fez teatro e palhaçaria naquela cidade. Este trabalho resgata a importância da arte em locais carentes de atividades artísticas e de lazer, e Porto Grande foi merecedora de ter o seu próprio palhaço. É um resgate importantíssimo para a história da cidade.

     Palhaço Jamelão era um personagem criado por Rudinaldo Coutinho Vasconcelos, natural de Macapá, sendo que seus pais migraram do Pará e se instalaram nesta cidade Tucuju. Em Porto Grande, onde morou a maior parte de sua vida, também era conhecido como “Barriga”, denominação dada por seus parentes e amigos. Esse apelido carinhoso surgiu em função de que Rudinaldo, vivia entre dois extremos, ele tinha a facilidade de engordar, como também de ficar magro. Mas corria o boato de que quando ele estava solteiro sempre ficava magro e quando casava, se tornava gordo. Em suas andanças ele morou em Macapá, Santana e terminou se instalando definitivamente em Porto Grande.

     Fazia turnê por toda a região, até no Cupixi chegou a se apresentar, além de vários garimpos do interior do Estado. Rudinaldo Vasconcelos, marcou o seu tempo na cidade de Porto Grande, e de muitos moradores que o viram representar seu querido palhaço Jamelão. No seu tempo, ele era o principal animador das crianças, dos jovens, dos adultos e dos idosos que presenciaram suas apresentações. Em todos os eventos da cidade ele estava presente, com seu famoso palhaço. Como morou muito tempo nas cercanias do balneário da cidade, ele era tido como o herói guardião do balneário de Porto Grande.

     Em relação às suas características, Palhaço Jamelão usava calça bem apertada, de uma cor e a camisa com cores distintas, sempre muito bem colorido, e se apresentava geralmente com um barrigão, e como todo palhaço, com maquiagem que ampliasse olhos e nariz e boca, que geralmente era vermelha. Para completar seu figurino, usava um sapato com a parte frontal comprida para dar destaque, com uma bola na parte da frente do sapato. Além da minha presença como orientador, participaram da banca avaliativa os seguintes professores: Dr. Frederico de Carvalho Ferreira (Curso de Teatro) e Dra. Silvia Carla Marques Costa, (Curso de Artes Visuais). Que prossigam as pesquisas sobre teatro do Amapá.

segunda-feira, 7 de agosto de 2023

NA FÁBRICA DE ALPERCATAS

 


     Para sobreviver, seu Aprígio, que foi meu vizinho por vários anos, inventava de tudo. Ele transitava por todos os ramos do comércio, dependendo de cada fase do ano, por exemplo, no carnaval ele vendia produtos carnavalescos como talco, lança de espirrar água, máscaras, serpentinas, entre outros; durante o mês de junho comercializava fogos de artifício, entre outros produtos juninos; no final do ano, era a vez de produtos relacionados à papai Noel e árvores de natal e assim ia compensando suas necessidades financeiras e de sua família.

     Seu Aprígio era um homem brincalhão, mas também era cheio de coragem, determinação, com espírito de liderança e com forte tendência para superar os obstáculos da vida. Completamente envolvido com o povo da cidade de Itabaiana, interior da Paraíba, se metia em dirigir times de futebol, coordenar blocos de carnaval e sempre estava completamente em sintonia com a cultura local. Fazia parte da União de Artistas e Operários da cidade. Além de tudo isso, ele tinha uma pequena fábrica de calçados, mais especificamente alpercatas, instalada no quintal de sua própria casa. O fato é que comecei a me envolver com sua pequena fabricação de alpercatas.

     Enquanto sua residência estava fincada num terreno plano, o mesmo não acontecia com o quintal da casa; em função do terreno ser extremamente acidentado, apresentava uma inclinação de aproximadamente 40 graus, onde ele distribuiu em escala ascendente, três pequenos compartimentos construídos em alvenaria, para desenvolver suas atividades laborais, no que diz respeito à fabricação de alpercatas.  Era tão íngreme que, do segundo prédio já dava para observar o telhado da casa, como também a própria Rua da Palha.

     O primeiro prédio, que estava na parte de baixo, era uma oficina que servia para os últimos detalhes como limpar, polir e encaixar as alpercatas; já o segundo prédio era o coração da pequena fábrica, era lá, o verdadeiro laboratório que servia de local para a total fabricação das sandálias de couro. Seguindo a inclinação do quintal de Seu Aprígio, o terceiro pavimento que ficava mais acima, servia como armazém para a guarda de materiais diversos como também de alpercatas já prontas para serem comercializadas.

     Essa história de minha vida de adolescente, aconteceu no ano de 1973, e foi assim que, na perspectiva de ser gente grande, com meus 11 anos de idade, passei a dominar todos os pequenos aparelhos e meios de produção necessários para fabricar alpercatas. A partir da prática cotidiana, aprendi todo o caminho metodológico, partindo do material necessário até o produto pronto, para ser colocado à venda. Faca amoladíssima, taxas, peças de couro, cartões grossos, tinta para colorir, máquinas para costurar as alpercatas, colar o material e fazer o polimento total, tudo isso eu aprendi naquela nostálgica fabriqueta.  

     O primeiro par de alpercatas que produzi, foi de grande significado para minha pessoa, visto que eu jamais acreditava que podia transformar materiais simples e tão comuns em alpercatas, que, de forma utilitária seriam usadas no dia a dia, nos pés de muita gente. Por mais que recebesse apenas alguns trocados pelo serviço realizado, o que mais valeu, hoje percebo isso, foi a experiência de ter conhecido e vivenciado a arte dos artífices, de artistas e operários que em muito contribuíram para o desenvolvimento da sociedade em geral, desde tempos remotos.