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segunda-feira, 19 de outubro de 2015

FAMÍLIA NA SALA

     As gerações mais novas talvez não saibam, mas antes do advento da televisão e principalmente depois do jantar, as famílias sempre se reuniam na sala da casa para poder colocar os assuntos em dia, enquanto as crianças brincavam no terreiro à frente. Costume que praticamente anda esquecido na atualidade. Era uma época em que apenas o rádio existia e quando não, os circos (famílias nômades) que passavam de cidade em cidade. Além da roda de conversa com a própria família, ainda existia a roda de conversa com os vizinhos.
     As famílias também se reuniam para discutir o espetáculo circense e falar sobre o palhaço e ainda assuntos sobre namoros e casamentos dos filhos, que era uma preocupação latente. De toda forma, também havia a roda de conversa sobre a novela transmitida pelo rádio. Numa família de agricultores havia a noitada de conversas enquanto se amarrava os molhos de feijão para vender na feira da cidade.
     “Família na Sala” é um nome bastante sugestivo que meu amigo e escritor Almeida Júnior escolheu para seu livro. Obra que ele inicia com a chegada da filha no voo da madrugada, que há muito tempo não havia visto sua família. Aliás, madrugada que não acabou em função de tantos temas e assuntos que tinham para conversar até o amanhecer do dia, que se complementou com o café da manhã. Só este fato já indica os sucessivos assuntos que virão um após o outro até finalizar sua obra.
     Por sua vez, quando sempre longe de casa, a filha comumente se alimentava com uma simples lembrança que era a da sua família reunida na sala de casa. Distante dos seus familiares esta lembrança era o suficiente para acalmar seu coração na esperança por dias melhores. Isto nos leva a pensar o quanto os pais e a família como um todo, são extremamente importantes embora os filhos só apercebam esta relação quando iniciam sua vida e sua independência econômica e social. Geralmente é nessa fase que os filhos começam a levar em consideração o que os pais e a família sempre fizera por eles.
     E é numa dessas passagens do seu livro que Almeida Júnior tenta explicar metaforicamente ao leitor, esta relação perceptiva existente na família, mas que transparece cotidiano, vulgar, comum e trivial para os menos desavisados: “Mas as grades deixavam ver o gramado e o jardim cheio de flores, e os postes que acendiam a noite” (p.27).
     Sabe-se que muitos jovens se rebelam contra seus pais e fogem de casa para tentar uma nova vida, e é nessa ocasião que muitos deles têm a oportunidade de refletir sobre si mesmo e sobre sua própria família, analisando o valor que ela tem. Sem a maturidade necessária para enfrentar o mundo, em muitos casos vários deles retornam para a casa dos pais, enquanto que outros acabam sua vida com o uso de entorpecentes. Em outras passagens da obra o autor também faz uso da figura de linguagem quando escreve: “A Lua vestia-se como se fosse para a noite de núpcias com um véu, um halo” (p.43), e ainda: “O Sol nascente, também sonolento, lembrou-me o tempo” (p.44).
     A partir do ato da escrita, nesta coletânea de contos o autor também nos leva a imaginar como se estivéssemos num vernissage de um artista visual, quando assim inicia seu capítulo metamorfose: “Navios mercantes e pequenos barcos flutuavam tranquilos, criando a sensação de uma imagem congelada em um cartão postal” (p.31).
     Por outro lado, faz uso da criatividade do teatro na tentativa de melhor se aproximar do leitor, quando busca identificar e caracterizar seu personagem de forma precisa para que o próprio leitor possa julgar o desenrolar da trama. Ao explanar sobre seu personagem diz ele: “Um homem forte, calçando chinelos de couro cru, calças largas tipo jeans com a barra enrolada até perto dos joelhos, camisa social com gola, semiaberta no peito e mangas enroladas acima dos cotovelos” (p.32). Aqui o autor busca a partir de suas palavras, motivar e facilitar o imaginário do leitor, para que ele (leitor), possa fluir na compreensão do personagem e nas características gerais do texto.
     Como se pode observar, Almeida Júnior sabe muito bem utilizar fatores diversos para desenvolver sua escrita e sua prosa. Ele transita por várias esferas da arte para poder diversificar o desenrolar de seu texto, portanto é um autor astucioso e audacioso. Aliás, é bom frisar que entre outras ele já publicou: “Antologia Experimental”; “Ensaio Geral”; e “Horas vivas”. Isto implica dizer que um autor sempre está em constante crescimento, e Almeida Júnior se insere nesse rol.
     Estou escrevendo uma obra, na qual enfoco minhas reminiscências quando criança no sítio do meu avô, só quem viveu momentos assim sabe o que significa a natureza e a simplicidade das pessoas. Almeida Júnior nos remete a momentos semelhantes quando focaliza a seguinte passagem: “... tratou de anotar o nome de tudo e de todos; das árvores, dos marrecos, das galinhas, dos vizinhos, dos filhos dos vizinhos, das vacas, dos cabritos, das formigas, dos cavalos, dos pássaros, das histórias, dos duendes, dos peixes, dos rios, dos cheiros, da brisa do ar” (p.75).

     Para finalizar, ainda nesta página há uma passagem muito importante que serve de sobreaviso para qualquer cidadão que vive em sociedade: “Extinguir-se do mundo é correr o risco de desaparecer da lembrança da história”. Parabenizo o autor por mais esta publicação e aqui deixo o meu recado: para quem desejar uma boa leitura, não esqueça de ler “FAMÍLIA NA SALA” de Almeida Júnior. 

quarta-feira, 3 de junho de 2015

CECÍLIA LOBO E O TEATRO NO AMAPÁ


     Cecília Palheta Lobo entrou no teatro quase que por acaso, na época em que a professora Nazaré Trindade trabalhava no SESC e estava montando o espetáculo “A Eleição”. Em função da falta de uma atriz, foi convidada por Nazaré para participar da referida montagem. Leiga e mesmo sem conhecer nada sobre teatro aceitou e passou a ensaiar no galpão do SESC que se localizava na Rua Odilardo Silva.
    Acompanhou a montagem ensaiando todas as noites e participando de todas as apresentações. Foi no teatro, que ela aprendeu a pesquisar, a conviver com os outros, técnicas novas, conversar com a plateia, iluminação, sonoplastia e tudo o que envolve um espetáculo teatral. Trabalhou com atores conhecidos como Raimundo Conceição e Marcio Bacelar. Para ela, o SESC se transformou na grande oportunidade que a fez descobrir esse lado artístico e teatral.
     Num determinado momento de sua carreira, Cecília Lobo percebeu que realmente havia se encaixado dentro do teatro, quando num dos espetáculos a plateia a aplaudia de pé, como também em função da sua criatividade os próprios colegas de trabalho a parabenizavam por sua desenvoltura e construção da personagem.
     Depois da peça “A Eleição” montou o espetáculo chamado “Matinta Pereira”, quando interpretou o papel de uma vovó contadora de histórias. Contava as histórias de Matinta Pereira que era protetora da natureza. Depois de ter passado por essas duas peças, Cecília Lobo apaixonou-se pelo que fazia e encarou o teatro com profissionalismo realizando vários outros trabalhos no Estado do Amapá. Organizou-se com um pequeno grupo de atrizes como: Richene Amim, Sol Pelaes, Andréia e Roberta. Com esse grupo montou várias esquetes como também fez teatro de rua. O Macapá Verão foi um dos locais que o grupo mais se apresentou.
     Um momento crucial de decisão na vida de Cecília Lobo foi quando a professora Nazaré Trindade deixou o SESC para assumir a Coordenação do Curso de Educação Artística na Universidade Federal do Amapá. Em função disso, Paulo Rodrigues convidou a Cecília Lobo para assumir a vaga de Técnica em Teatro do SESC, deixada por Nazaré Trindade.
     Com apoio do SESC Cecília viajou por vários centros do Brasil, como Rio de Janeiro e São Paulo, participando de cursos e oficinas de teatro, o que em muito a ajudou a desenvolver seu trabalho no SESC como também na produção cultural. Com esse aprendizado, passou a repassar esses conhecimentos e a ministrar oficinas no próprio SESC.
     Após sua saída do SESC e com a carga de conhecimento que havia adquirido lá, passou a se dedicar à produção cultural. Por um período chegou a dirigir a peça “Bar Caboclo”. Dirigiu a peça “Castelo Misterioso” com a participação das atrizes Richene Amim, Andréia e Sol Pelaes. Espetáculo que enfocava a questão da higiene e ambiental. Durante a década de 1990, o grupo viajou por vários municípios do Amapá.
     Foi no período em que era diretora da peça “Bar Caboclo”, que conseguiu pela primeira vez, lotar o Teatro das Bacabeiras, feito que nenhum outro grupo tinha conquistado até aquela data. Época em que o grupo apresentava duas sessões. Nesse primeiro momento, o espetáculo tinha como base especificamente a pesquisa sobre o antigo bar que existira em Macapá.
     As peças “Bar Caboclo” e “Castelo Misterioso” participaram de várias turnês pelo interior do Estado, dentro do “Projeto Pé na Estrada”. Depois dessa fase, Cecília Lobo ingressa numa universidade para realizar seu curso superior. A partir dai passou a se dedicar à educação enveredando para um trabalho com teatro de bonecos.
     Participou dos seguintes espetáculos, como atriz: “A Eleição - 1986”, “Matinta Pereira - 1986”, “O Rapto das Cebolinhas – 1987”, “Estatuto da Criança – 1989”, “O Natal do Comerciário – 1989”; “O Auto do Menestrel – 2007”, “Retratos de Uma Atriz – 2008 a 2010”, “O Sonho de Doroty – 2010 e 2011”, “Compadre da Morte e Amigo do Diabo – 2010 e 2011”, “As Aventuras de Soneca e Nheco – 2009 a 2001”, e “Ai, Meu Dentinho”. Como diretora: “Palco, Sonho e Fantasia – 1989”, “Castelinho Misterioso – 1991 a 1999”, “Lei é Lei Está Acabado – 1991 e 1992”, “Aniversário do Lobo – 1993 a 1995”, “Bar Caboclo – 1992 a 2000”, “O Casamento – 2001”, “O Mundo de Alan – 2008”, “Dona Baratinha Na Ilha das Flores – 2007 a 2011”, “Auto de Natal, Jesus – 2009 a 2011”, entre outros.

     Cecília Lobo é formada em Letras pela Universidade Federal do Amapá; é Pós-Graduada em Educação e atualmente é professora de ensino fundamental e médio no Estado do Amapá. 

segunda-feira, 18 de maio de 2015

O CURSO DE TEATRO DA UNIFAP E A II SEMANA ACADÊMICA



     Em 1994 quando aqui cheguei para realizar prova de concurso público para professor do Magistério Superior, trouxe comigo uma missão: a de implantar o Curso de Licenciatura em Teatro na Universidade Federal do Amapá. Ao longo das últimas três décadas muitos foram os eixos que nortearam a reflexão da formação docente na área do teatro. Porém, atualmente o que centraliza os entendimentos é a qualificação em nível de ensino superior que perpassa pela emergente necessidade de ampliar a discussão acerca das reflexões e possibilidades didáticas e pedagógicas que o espaço acadêmico provoca na contemporaneidade e as circunstâncias e convergências reflexivas, sensorial e estética que abriga a linguagem teatral, sobretudo na promoção e formação dos sujeitos de modo geral.
     Para o curso de Teatro da UNIFAP alinhei três eixos para propor a elaboração do Plano Político Pedagógico: primeiro: compreensão do espaço de formação como produtor de saberes em vista a articulação entre investigadores da ciência educativa, estética e teatral; segundo: aspectos históricos e culturais do espaço do teatro nas sociedades; e terceiro: interesse com as demandas contemporâneas, enfoques midiáticos e tecnológicos que a teatralidade cênica intervém a partir de sua concepção epistemológica.
     Em busca de efetiva articulação busquei nas percepções de formação e produção teatral um redimensionamento amplo, entremeadas pela cognição, processos científicos de experimentação, sobretudo balizados por um sentido e sentimento estético em perspectivas plurais da construção de conhecimentos/saberes. Esperando que assim os espaços da universidade e os momentos articulados desse espaço/tempo possam desterritorializar modos de aprender e modos de ensinar aceitando momentos entre o pensar e o realizar.
     Assim, elaborar atitudes participativas, ouvindo o clamor da comunidade amapaense que há muito tempo esperava um curso dessa competência é de todo modo perceber e compreender aqueles que escolheram a licenciatura em teatro como futuros professores intelectuais, contínuos pesquisadores e produtores de cultura.
     É com este entendimento: filosóficos, conceitual, sobretudo de um sentimento humanístico que a organização desses eixos norteou o projeto. Por outro lado, atende a complexidade que a sociedade contemporânea vive, onde exige e requer outros trânsitos para se perceber, entender, aprender, ensinar e fazer teatro no espaço da formação docente. Aqui faço, uma ressalva acerca desses trânsitos, assumindo novos desafios conceituais, atentando para que o ensino superior de teatro seja desvinculado das ideias de aprendizagens e ensino como mera transmissão de conhecimento.
     Escolher, persistir e seguir tais concepções é acolher desafios que não paralisam o pensar, nem a ação acadêmica, ao contrário, ganham força e dinamizam o processo de (re) pensar as licenciaturas, consolidando a qualidade da formação de professores em teatro. Contudo, e continuamente deverei rever metas e estabelecer tanto quanto forem necessárias; ideias e percepções que mesmo na provisoriedade ajudem a construir outras aprendizagens.
     O Curso de teatro da UNIFAP foi aprovado pelo Conselho Superior em 12 de novembro de 2013. A primeira turma iniciou em março de 2014. Neste ano realizamos a I Semana Acadêmica do Curso de Teatro; o I Seminário Científico em Artes Cênicas, lançamentos de Livros, Ciclos de Palestras entre outros eventos. Atualmente estamos com duas turmas. Próximo concurso público para professor, teremos sete vagas para o curso de teatro. Estão sendo encaminhados e estudados a construção de dois teatros; um em estilo italiano e outro de arena.
     Estamos promovendo no período de 18 a 22 do mês em curso, a II Semana Acadêmica do Curso de Teatro com vasta programação: no dia 18 às 09h, palestra, “O Setor de Cultura do SESC”, com Genário Dunas; às 10:30 apresentação do espetáculo “Os Magníficos” com a Companhia Sem Teto; no dia 19 acontecerá a mesa redonda Perspectivas do Ensino do Teatro no Amapá com participação de convidados da SEED, SEMED, SECULT, FUMCULT e Rede Particular de Ensino; dia 20 a programação continuará às 9h com Workshop  “Contação de História”, com o ator e contador de histórias Joca Monteiro; dia 21: Palestra “Amadeu Lobato e a Formação de Atores no Amapá”, com o diretor de teatro Amadeu Lobato;  em seguida a palestra “O Reggae, origem e vertentes” com o Dj Duffnaldo; dia 22; Palestra com o diretor Paulo Alfaia sobre “A Experiência do Grupo Desclassificáveis; em seguida a apresentação do espetáculo “Cabaré, Anjos em Crise.com”.

     O II Encontro Acadêmico do Curso de Teatro será aberto a alunos de graduação e à comunidade em geral com direito a certificado. Este evento é uma realização do Curso de Teatro com apoio do Grupo de Pesquisa em Artes Cênicas/UNIFAP e do Núcleo Amazônico de Estudos das Artes Cênicas/NACE/UNIFAP. A comissão organizadora é composta pelo Prof. Dr. Romualdo Palhano e pelos acadêmicos: Aninha Martins, Larissa Macedo, Carla Thais, Jayne Alves e Jhou Santos. 

domingo, 3 de maio de 2015

DISNEY SILVA - De Artista a Secretário de Cultura


     Disney Furtado da Silva é um caboclo do Norte que tem dedicado sua vida à arte e à cultura do Estado do Amapá. É carnavalesco, produtor cultural, dramaturgo, ator e diretor de teatro. Escreveu entre outros, o famoso texto “Bar Caboclo”, que o transformou em espetáculo muito conhecido dos amapaenses. Seu primeiro contato com as artes cênicas foi em 1978, quando iniciou sua carreira no extinto grupo de teatro do SESC/AP, do qual, participou pelo menos por dois anos seguidos até a extinção do próprio grupo. Nessa época, também participou de oficinas promovidas pelo antigo MOBRAL.
     Cinco anos mais tarde, (em 1983), juntamente com alguns amigos como: Raimundo Conceição, Jackson Amaral, Sol Pelaes, Rechene Amim, Marcio Bacelar, entre outros, fundou o Grupo Língua de Trapo que ainda continua em plena atividade. No referido grupo, participou como ator das seguintes peças: “Repiquete”, de Francisco Carlos; “Paixão de Ajuricaba”, de Márcio Souza, entre outros.
     Intensa é sua contribuição com a cultura, com a arte e principalmente com o teatro no Amapá. Ao longo de sua carreia, além do Língua de Trapo ajudou a fundar outros como, por exemplo, o “Grupo de Teatro da Secretaria de Promoção Social” do governo do Estado, quando participou das encenações de “Pluft O Fantasminha” de Maria Clara Machado e ainda “Beatles e a Revolução Social”.
     Sua experiência na vida prática dedicada ao teatro o ajudou no seu amadurecimento e com este suporte resolveu escrever peças e se tornar também dramaturgo. E é ai que surge seu primeiro texto, o renomado “Bar Caboclo” que foi apresentado pela primeira vez em 1991. Depois do sucesso da montagem desse espetáculo, resolveu definitivamente escrever e encenar seus próprios textos.
     E foram sendo escritos e encenados: “Seu Pinto, Uma Filosofia de Vida”; “No Tempo da Ditadura”; “Pecado”; “Triângulo”; “Os Cabuçús no Bar Caboclo”; “Do Oiapoque para o Brasil, A História Que Ninguém Viu”; “Nazareno, O Revolucionário”; “O Bug do Zé Lixão”, além dos infantis “A Turma da Fanfarra”; “Surpresa de Pompom” e “A Casa Mal Assombrada”.
      Disney Silva é amapaense, servidor público do quadro do Ex-Território Federal do Amapá. Tem formação em Marketing e Comunicação pela Faculdade SEAMA e Administração e Marketing pela FAMAP. Foi Diretor do Teatro das Bacabeiras e Vice Presidente da Confederação Brasileira de Teatro – CBT. É Ex-Presidente da Federação Amapaense de Teatro Amador – FATA. Há mais de 25 anos é carnavalesco e já contribuiu com as seguintes escolas de samba: Maracatu da Favela; Grêmio Recreativo Império de Samba Cidade de Macapá; Unidos do Buritizal; Embaixada de Samba da Cidade de Macapá, campeã no ano de 2007 e Piratas da Batucada, campeã em 2012.      No Amapá, promoveu o I e II Festival de Teatro no Meio do Mundo e o Festival Nacional de Teatro, que aconteceu em 2008.
     Há mais de 40 anos que Disney Silva vem se dedicando ao teatro e à cultura no Amapá. Entre os espetáculos montados pelo Grupo Língua de Trapo poderíamos destacar: “Pecado”; “A Saga de Seu Pinto” e “Bar Caboclo”.  “Pecado” (que esteve em cartaz no ano de 1998) é um texto que focaliza-se especialmente no pecado religioso. No espetáculo, o tema poderia ter sido mais explorado pelo autor. Segue a mesma linha do “Bar Caboclo”, mas consegue conquistar a atenção do público.
     “A Saga de Seu Pinto” (em cartaz em 2007) era um espetáculo de sessenta minutos em que o texto nos remete a problemas conjugais criados, rejeitados e ao mesmo tempo aceitos no subsolo e na escuridão moral da sociedade burguesa contemporânea. É ligeiramente popular em função de sua linguagem clara e elementar. Portanto, encontra-se pleno de mexericos, intrigas e bisbilhotices, e tenta enfocar problemas psicológicos e emocionais de relacionamentos amorosos desgastados pelo tempo.
     Não se pode discutir que seu trabalho mais famoso é o espetáculo “Bar Caboclo” com texto do mesmo nome. Mesmo tendo sido produzido antes, há vinte anos que vem sendo apresentado, inclusive é um dos únicos trabalhos de teatro do Estado que consegue lotar o Teatro das Bacabeiras. O texto foi criado a partir de pesquisas sobre um bar que realmente existiu nas docas da antiga cidade de Macapá. Era um dos mais famosos prostíbulos da década de 1960 e localizava-se na esquina da Avenida Mendonça Junior com a Rua São José.
     Constitui-se de um espetáculo de expressão para nossa sociedade, visto que resgata esse famoso bar que outrora existira em nossa cidade. O texto não enaltece heróis, como é de costume, mas revela a vida de pessoas simples, quietas e discriminadas pela sociedade como pobres, prostitutas, lésbicas, loucas, gays, gigolôs, anciãos, idosos, crianças e negros.

     Um exemplo disso está na própria personagem “Chicona”. Vários desses adjetivos está nesse exemplo típico de mulher negra, anciã, prostituta, gorda e pobre. Apesar de se direcionar ao Bar Caboclo, o texto traz à tona discussões relacionadas às questões sociais e antropológicas referentes à inclusão social. Por isso, o mesmo continua atualizado, visto que esta é uma das questões que tanto se discute nos dias de hoje. Disney Silva é um cara batalhador e dedicado às artes em nosso meio, e foi em função do seu trabalho que passou de Artista a Secretário de Cultura do Estado do Amapá.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

AS FACES DE CRISTO - Conforme a Maré


                                      
     A Companhia Cangapé idealizou e concretizou o projeto da encenação de “As Faces de Cristo”, que versa sobre a quaresma. A quaresma é o período de 40 dias que inicia na quarta-feira de cinzas e vai até o domingo de páscoa. É nesse espaço de tempo o momento em que católicos e ortodoxos se dedicam à penitência. O espetáculo foi apresentado no dia 17 de maio do ano em curso, uma sexta-feira. O início estava marcado para as 19:30h, todavia, como é de costume foi preciso esperar o tempo passar um pouco para que a maré pudesse baixar.
     Na montagem deste espetáculo apresentado ao ar livre e dentro do rio Amazonas, a Companhia Cangapé objetivou experimentar novas possibilidades estéticas de representação cênica não tradicional. O espetáculo foi encenado próximo à rotatória do bairro Santa Inês, em Macapá. Apesar da neblina que caía sequencialmente, o espetáculo aconteceu normalmente, inclusive conquistando o público e curiosos que por ali passavam e paravam para assistir ao espetáculo.
     Desde que foi fundada, a companhia Cangapé vem circulando por vários gêneros e estéticas cênicas, como: teatro, dança e circo e agora volta-se para este trabalho que é mais uma ousadia do grupo. Torna-se evidente em suas atividades a forte presença do circo. Contudo, nota-se esta presença fundamental que também é marcante na montagem de “As Faces de Cristo”.
          No geral, o espetáculo se desenvolveu bem, inclusive conquistando um público considerado, que se espalhou pelo menos por cento e cinquenta metros no muro de arrimo entre a cidade de Macapá e o rio Amazonas. Como é uma nova linguagem, ou seja, um espetáculo que apresenta maiores proporções no que diz respeito ao espaço, número de atores e figurantes, iluminação, sonoplastia e visualidades cenográficas; alguns detalhes se fazem necessários para que a relação entre o teatro, a imagem, os olhos de quem realiza e os olhos de quem vê se coadunam gerando sensação de harmonia para a formação do quadro cênico.
     Entretanto, levando-se em consideração as técnicas teatrais e circenses e os aspectos semiológicos das artes cênicas em geral, enfocarei aqui, algumas sugestões para que sejam observadas pelo grupo. Quanto mais distante do público, consequentemente o espaço cênico exigirá maior amplidão dos atores, do cenário e da cena em geral, para dar lugar e significado à representação, diante das pessoas que assistem efetivamente a um espetáculo. Os gregos já faziam isso há 2.500 anos antes de Cristo quando colocavam batas com listras verticais em seu vestuário para criarem ilusão de ótica e se tornarem mais altos perante os olhos do público.
     Outra questão gira em torno da boa utilização do espaço e nuances oferecidas pelo próprio rio. Várias cenas poderiam acontecer tendo como ponto de partida os espelhos d’água que são naturalmente oferecidos pelo rio, gerando nas cenas bela plasticidade, quando as mesmas passam a refletir na própria água. No espaço geográfico do rio Amazonas ficam expostas pequenas ilhas e pequenas poças d’água que devem ser utilizadas como fonte de beleza natural da peça.
     Algumas cenas foram apresentadas sendo encobertas pelas bandeiras brancas que representavam barcos e que foram utilizadas como parte do cenário. Em determinados momentos a visão do público era prejudicada em função dessas bandeiras. Nesse caso, as cenas deveriam ser localizadas à frente das referidas bandeiras, para uma melhor visão do público. Desta forma, permaneceriam em cena, visto que estavam num plano mais alto que os próprios atores. Isto seria bom para dar melhor brilho ao cenário, delimitação do mesmo e principalmente contribuiria demasiadamente para o visual plástico da encenação.
     Em relação à iluminação, se faz necessário mais pontos de luz em direção ao leito do rio, enquanto que no cenário propriamente dito, o número de tochas deveria ser quadruplicados para gerar melhor sensação de plasticidade. Assim, teríamos consequentemente mais iluminação das cenas. Nesse tipo de espetáculo, geralmente os atores não andam, caminham rápido ou correm. Contudo, para que seus corpos possam ficar mais elásticos, deverão exagerar nos gestos e movimentos. Em função da distância, esses movimentos parecerão normais aos olhos do público.
     O grupo tem que insistir nesse espetáculo. Entendo que “As Faces de Cristo” deveria entrar para o calendário da Companhia Cangapé e ser apresentado todos os anos no leito do rio Amazonas. O trabalho foi uma realização da Cia quem tem à frente Washington Silva, Mauro Santos, Alice Araújo, Cleber Luiz e Keila Moreira. O espetáculo teve apoio do Coletivo de Artistas Produtores e Técnicos em Teatro do Estado do Amapá – CAPTTA; Secretaria de Estado da Cultura – SECULT e do Conselho de Cultura – CONSEC.

     Valeu a ideia, a ousadia e a persistência da Companhia Cangapé. Todos os atores que se dedicaram ao espetáculo estão de parabéns, “As Faces de Cristo” foi uma boa oportunidade para quem presenciou o evento. Todos sabem que em nossa região tudo depende da maré. Na Amazônia é assim, até o teatro acontece conforme a maré. 

sexta-feira, 24 de abril de 2015

BI TRINDADE - O MENINO DO LAGUINHO

    
    Reconhecido como artista de primeira linha, na década de 1970, Bi Trindade exerceu grande influência no que diz respeito às artes no Amapá, digo, às artes em geral. Sim! Visto que ele era um artista versátil: ator, escritor, poeta, músico, professor, além de ser tradutor de várias composições da Música Popular amapaense para o idioma francês.
     Como tantos outros artistas da década de 1970, o teatro surgiu na vida de Bi Trindade no bairro do Laguinho, principalmente no Grupo Telhado. Também não poderia deixar de ser, foi contemporâneo de Osvaldo Simões, Consolação Corte, Juvenal Canto entre outros jovens da época.
     É considerável afirmar que na década de 1970, com a criação do Grupo Telhado; com a criação do Grupo Pilão e com vários eventos artísticos, como feiras de artes, promovidos por esse grupo de pessoas. Foram os jovens do Laguinho que conseguiram transformar o seu bairro no maior centro cultural do Estado do Amapá, naquele momento histórico.
       O Telhado foi um grupo de teatro que em muito contribuiu para a formação de atores do Amapá, visto que o grupo trabalhava observando a arte como um sério métier. Lembra Bi, que o grupo conseguiu assinar convênio com o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL. Em função do seu trabalho, o grupo conquistou e teve à sua disposição o Cineteatro Territorial, para realizar seus ensaios e suas apresentações.
     Mas, o telhado não só se dedicava à arte pela arte. Como grupo de vanguarda se preocupava tanto com o trabalho artístico, no caso a mise em scéne, como em debater com a sociedade local suas angústias, suas emoções e seus problemas político e sociais. Bi Trindade participou em espetáculos como: “Antônio, Meu Santo” e “A Mulher que Casou 18 Vezes” e “O Menino do Laguinho”.
     “A Mulher que Casou 18 Vezes” além de ter sido um bonito espetáculo, nela Bi representou dois personagens e ainda trabalhou na música. Foi uma adaptação de cordel, que deixava o público sempre à vontade porque era de fácil compreensão. Além disso a peça deixou para ele a experiência de viajar pelos cinco municípios amapaenses que existiam na época: Macapá, Porto Grande, Ferreira Gomes, Calçoene, Amapá e Oiapoque.
     Além do Grupo Telhado, Bi participou de outros grupos de igrejas como São Benedito e Jesus de Nazaré. Em 1977, na igreja São Benedito, padre José solicitou que o grupo apresentasse a via sacra ao vivo pelas ruas do bairro laguinho. O trajeto ficou assim determinado: saída da referida igreja, seguindo por ruas do Pacoval; depois, passando em frente à igreja Nossa Senhora Aparecida, em seguida voltando pela rua Eliezer Levy e boêmios do Laguinho, para finalizar com a crucificação de Cristo que acontecia na Igreja São Benedito.
     No trajeto, o povo do Laguinho seguia a Via Sacra como se fossem verdadeiros figurantes. Seguiam como verdadeiros romeiros, como se estivessem seguindo o próprio Cristo. Nessa apresentação aconteceu um fato sui gêneris no teatro do Amapá, é quando Bi tornou-se pela primeira vez na história do teatro o primeiro cristo negro numa montagem sobre a vida de cristo, no Amapá.
     Outro legado que Bi Trindade trouxe desse período, foi não só o fato de ter sido bom ator, mas de ter se tornado um dos melhores intérpretes de música amapaense. Por todo esse tempo ele transitou entre o teatro e a música, sendo também um dos fundadores do Grupo Pilão. Muitas vezes era ator e compositor das músicas das peças, caso que aconteceu na montagem “O Menino do Laguinho”.
     A peça “O Menino do Laguinho”, cujo diretor era Pedro Tavares, foi pensada pelo grupo de forma coletiva, portanto, não houve um autor específico. Nesse espetáculo, Bi Trindade representava um personagem que ensinava um cego. O Menino do Laguinho serviu como ponto de partida para Bi em função de que foi o primeiro trabalho que participou, exaltando o lugar em que morava e suas origens. O espetáculo exaltava a problemática do amapaense, focando o menino do laguinho.
     Na década de 1980 foi parceiro de Celso Dias quando participou no Grupo de Teatro do SESC/Amapá. Nessa época, o SESC foi um dos grandes motivadores da arte no Amapá. O fato de ter se dedicado ao teatro em muito contribuiu para exerce o magistério como professor de francês.
     Iniciou como cantor, imitando artistas como Wilson Simonal e Toni Tornado e foi um dos fundadores do Grupo Pilão, do qual se tornou compositor e cantor efetivo. Por outro lado, para ele, o teatro foi uma saída em busca de entretenimento, para ocupar a mente, para se divertir e para levar alegria para outras pessoas. Fato é que o Grupo Telhado na década de 1970, foi um movimento de mobilização que teve sua importância na formação cultural de muitos jovens no Estado do Amapá. E foi no Telhado, que Bi Trindade se considerava o próprio Menino do Laguinho.


segunda-feira, 30 de março de 2015

OSVALDO SIMÕES E O TEATRO NO AMAPÁ



     Francisco Osvaldo Simões Filho é personalidade do teatro amapaense. Embora poucas pessoas saibam, em muito ele contribuiu com o teatro no Estado do Amapá, principalmente entre as décadas de 1970 e 1980. Na época da ditadura militar foi um dos principais atores que se dedicou na luta pela liberdade de expressão no Amapá.
    O mesmo iniciou sua carreira no teatro amapaense quando ainda não havia nos limites da cidade de Macapá a ideia de apresentações em espaços públicos como teatro e tablados que aqui existiam na década de 1970, como por exemplo, o palco da Rádio Educadora e da Rádio Difusora. Portanto, até a década de 1970 não havia grupos específicos com o intuito de se apresentarem nesses espaços. O que se tinha conhecimento até esse período era a apresentação de grupos no interior das igrejas e escolas espalhadas pela cidade.
     O próprio sistema ditatorial, determinava aquele momento histórico e fazia com que pequenos grupos se refugiassem principalmente no interior das igrejas.  E foi assim que muitos jovens buscaram seu refúgio realizando pequenos dramas e esquetes no interior das paróquias, único local que os apoiava intencionalmente. Vale lembrar que nesse período a cidade contava apenas com três espaços dignos de apresentação de espetáculos teatrais: os palcos das emissoras: Rádio Educativa (que pertencia à diocese) e Rádio Difusora (que pertencia ao governo do ex-Território), além do Cine Teatro Territorial que encontrava-se fechado naquele período.
     Sem sombra de dúvidas, na década de 1970, o bairro do Laguinho foi quem mais representou o desejo de liberdade no Amapá. Expoente na maioria das vezes no que diz respeito aos movimentos artísticos que aconteceram naquele período. Não só em relação especificamente ao teatro, mas à própria cultura como um todo. Como não poderia deixar de ser, o artista Osvaldo Simões vem do Laguinho, juntamente com um grupo de jovens com o desejo de contribuir com a arte que se fazia no Amapá, naquele período.
     Como o bairro do Laguinho tornou-se pequeno, o grupo, ávido de liberdade e cultura, passou a se encontrar no centro da cidade. Faziam parte dessa trupe: Osvaldo Simões, Maria Benigna, Eduardo Canto, Consolação Corte entre outros. “O Juiz de Paz na Roça” de Martins Pena, foi o primeiro texto em que Osvaldo participou como ator. O que era uma leitura dramática com o tempo transformou-se num espetáculo, que ficou em cartaz entre 1971 e 1972. Esta peça foi apresentada em locais alternativos nas cidades de Macapá e Santana.

     “Bonequinha de Pano” foi o segundo espetáculo que Osvaldo Simões trabalhou, sendo que nesta ocasião o grupo conseguiu apoio do SESI, que o estimulou com a doação do figurino do espetáculo. Foi a partir desse trabalho que o grupo passou a discutir um nome para determinar o próprio grupo, que ficou mais conhecido como “Telhado”. O Grupo de Teatro Telhado foi onde Osvaldo Simões vivenciou suas mais brilhantes experiências na área do teatro no Amapá. No entendimento de que a arte amapaense estava descoberta, foi assim que a turma de jovens decidiu colocar o nome do grupo de “Telhado”, com o objetivo dar uma cobertura na arte amapaense naquele momento. E Osvaldo Simões fez história como integrante do  Grupo de Teatro Telhado.