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domingo, 26 de fevereiro de 2023

TEATRO JESUÍTICO

 


     Para entender a história do teatro no Brasil, se faz necessário atentar para sua distinção e  compreensão de seus característicos momentos, quais sejam: Teatro Jesuítico, que se estende na colônia, desde século XVI até o século XVIII, culminando com a expulsão dos jesuítas, em 1759; o Romantismo, que tem seu início na primeira metade do século XVIII; o Realismo que tem sua origem a partir da segunda metade do século XIX; o Simbolismo, que começa nos primeiros anos do século XX; o Modernismo, que apesar da semana de arte moderna ter acontecido em 1922, só depois de 20 anos o  teatro moderno será definido com a apresentação da peça “Vestido de Noiva” de Nelson Rodrigues, em 1943.

     A Companhia de Jesus foi uma ordem criada em 1539, por Ignácio de Loyola e, foi extremamente importante no contexto da contrarreforma católica. Um dos objetivos era, por um lado, confrontar o avanço protestante, por outro, conquistar novos fiéis. Os jesuítas tinham em mente dois fins precisos: substituir uma religião por outra, e um código moral por outro. Resume-se num conjunto de peças escritas pelos membros da companhia e encenadas para e com os índios, como também nos colégios e ocasiões festivas.

     Embora os silvícolas já possuíssem suas formas de representação, características de suas culturas, como: música, dança, como também, representação dramática; o teatro no Brasil surge em paralelo ao descobrimento e, vai expandir-se, de preferência, a partir do ano de 1567, quando o padre José de Anchieta, apresenta Pregação Universal, na cidade de São Paulo de Piratininga. Seu principal objetivo era enfatizar os dogmas da igreja católica e adquirir caráter catequético. Do século XVII ao início do século XIX, o teatro é completamente colonial e fortemente influenciado pelo teatro português.

     Outro texto importante foi “O Auto da Festa de São Lourenço”, numa mistura de espanhol, português e tupi-guarani, esses textos visavam a catequese e eram encenados pelos indígenas. Essas peças escritas pelos jesuítas, enfocavam em seu enredo, o bem e o mal, confirmando os valores da virtude cristã, em função a tudo que era rechaçado sob a ótica dos jesuítas. Observa-se que o consumo exagerado do cauim, uma bebida alcoólica feita do caju e produzida pelos indígenas, era mostrado como negativo. O interessante é que até os dias atuais, por exemplo, os índios yanomamis, entre outros, ainda fazem uso dessa bebida sagrada, para sua cultura. Extraído do caju, a cajuína é uma bebida específica fabricada no Piauí, na atualidade.

     O teatro Jesuítico pode ser resumido como num conjunto de peças escritas pelos padres da companhia de jesus em todo o mundo. Os autos eram escritos exclusivamente pelos membros da referida companhia. As encenações sempre estavam relacionadas com uma festa maior, de caráter religioso. Outro objetivo era enfatizar os cânones e dogmas da igreja com perspectivas catequéticas. Em função da aplicação de sua principal metodologia de trabalho pedagógico, tendo por base a arte teatral, os jesuítas deixaram um importante legado, tanto em seus monastérios, escolas e conventos espalhados por todo o território nacional, como também, para o teatro brasileiro e geral.

 

   

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

CARRO NAVALIS

 


     As festividades do carnaval que conhecemos como se nos apresenta na atualidade, possuem vestígios antiquíssimos. Vamos encontrar algumas dessas evidências, em civilizações remotas, como na Suméria, Pérsia e principalmente nos antigos países Egito e Grécia. Esses povos cultuavam vários deuses e entre eles, sempre havia aquele deus da fertilidade, do sexo, da colheita, de momentos de bebidas intensas, de embriaguez, como também de liberação com perspectivas lascivas e de luxúrias.

     Entre os vários deuses, no panteão egípcio havia a deusa Bastet que era representada com o corpo humano, mas, com a cabeça de uma gata. Ela era considerada a protetora do lar, da vida doméstica, da fertilidade, do parto, dos segredos femininos e dos gatos. Os cultos em sua homenagem coincidiam com a colheita e a fabricação do vinho, momento em que havia alto consumo dessa bebida. Favorecia e motivava a euforia e o estado de embriaguez. Também era considerada a deusa da alegria, música, dança e do amor. Essas manifestações sempre aconteciam como um verdadeiro carnaval, visto que tudo era liberado nesses cultos.

     Na Grécia vamos nos deparar com o deus Dioniso, que também era deus da fertilidade, da colheita, do vinho, dos bacanais, e seus festivais eram intensos naquele país. O Objetivo do culto Dionisíaco era fazer com que a intensidade da paixão emergisse ao máximo. Dioniso era cultuado com ditirambos; canções cheias de momentos de livre expressão e plenas de paixão. Era uma divindade ligada ao campo. No início, essas festividades revolucionárias, revelavam uma espécie de transgressão em relação à sociedade grega da época.

     Tudo tinha início com imensas procissões, que partiam de determinados lugares até o Santuário do deus. Essas festividades se concentravam em três dias e transgrediam o cotidiano da sociedade grega. Semelhante ao carnaval da atualidade, sempre havia confronto em relação à transgressão dos valores sociais, como por exemplo: os homens se vestiam de mulheres, o pobre se vestia de rico, as prostitutas fingiam ser donzelas, tudo isso regado a muito vinho, dança e gritos de viva a Dioniso. Era uma festa que durava três dias, regada de muito vinho, admitindo-se que as relações sexuais ao ar livre, fossem absolutamente permitidas e consideradas habituais.

 

     Com o advento do Império Romano e dominação de toda a Europa, havia o “Festival Ploiafésia”, que era um evento greco-romano, também conhecido como Festival Isidis Navigium, quando um barco era montado numa carroça e dedicado à deusa Ísis. Este carro alegórico, também era conhecido como carro-navalis, ou seja, um carro transformado em navio que desfilava pela cidade, de onde deriva, certamente, a palavra carnaval.

     Também havia barcos que eram lançados ao mar em homenagem à deusa Ísis. Essa era uma das manifestações mais importantes do culto a Ísis, na época greco-romana. A Ploiafésia acontecia geralmente, duas vezes ao ano, mas, a mais concorrida acontecia no dia 5 de março, tendo em vista que era a mais original, e realizava-se no mesmo período onde havia melhores condições climáticas para a navegação. Com a perspectiva de relacionar a deusa Ísis aos imperadores romanos, decidiram criar novas datas para o lançamento do navio ao mar, mais especificamente, nos dias 5 e 6 de janeiro, de cada ano.

     Na contemporaneidade, as festas de carnaval pelo mundo afora, trazem consigo todo esse legado dos grandes festivais, em homenagem à deusa Bastet e Ísis, no Egito, e do culto ao deus Dioniso, na Grécia. Os navios que antes eram montados em carros e carroças em homenagem ao deus Dioniso, como também à deusa Ísis, Isidis Navigium, hoje se transformaram nos grandiosos carros alegóricos das escolas de samba que desfilam na atualidade, em homenagem ao Rei Momo.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

TEATRO PRÉ-CABRALINO

 


          Antes do descobrimento realizado pela façanha dos portugueses, já havia no Brasil mais de cinco milhões de silvícolas que habitavam o chamado novo continente. Com certeza, os invasores se depararam com índios com uma cultura completamente diferente dos europeus recém-chegados. Os nativos que habitavam essas novas terras, possuíam uma cultura bastante diversificada, o que se tornou uma grande surpresa para os grandes navegadores.

     Com sua rica cultura nativa, os índios possuíam manifestações em várias áreas da arte, que faziam parte de sua sociedade, como: dança, representações dramáticas, tocavam vários instrumentos, tinham seus deuses e seus cultos religiosos e ainda uma diversificada gastronomia. Tinham conhecimento específico para fabricar várias bebidas, como por exemplo, o cauim, a partir da colheita do caju. Desde a época do descobrimento, na atualidade, essa bebida ainda é fabricada em várias aldeias e principalmente pelos Yanomamis, isso há mais de quinhentos anos. Outra nuance desse licor, é a famosa cajuína, fabricada a partir do extrato do caju, no Estado do Piauí, e principalmente na capital Teresina.  

     Na época do descobrimento havia as seguintes nações indígenas: Tupi, que se espalhava pelo interior, mas, principalmente por toda costa atlântica; os Jê ou Tapuia, estes, já viviam no planalto central brasileiro; os Aruak, que habitavam a Bacia Amazônica; e os Karib, que ocupavam mais especificamente o norte da Bacia Amazônica. Em sua maioria, esses povos viviam em regime de comunidade primitiva, voltados para a produção comunitária. Moravam em ocas e dormiam em redes.

     A civilização indígena trouxe grande parcela de contribuição para o povo e a cultura brasileira, principalmente no que diz respeito à alimentação, podemos citar aqui, o cultivo da mandioca, o milho, entre outras iguarias que são importantíssimas para o povo brasileiro.  Em relação à religião, possuem o pajé, ele é o responsável pela relação entre o plano material e espiritual. Em muitos casos, são panteístas, quando acreditam que a natureza e o divino estão conectados. Panteísmo é uma ideologia filosófica que defende que Deus e o Universo são uma única coisa.

     É importantíssimo levar em consideração a contribuição indígena para nossa cultura, visto que na atualidade, são muitos os legados deixados para o Brasil contemporâneo.  Mas, é bom ressaltar que, antes do descobrimento do Brasil, por Pedro Álvares Cabral, os índios possuíam suas dramatizações. O certo é que nos dias de hoje, em várias cidades brasileiras, principalmente no período do carnaval, há blocos de índios que saem pelas ruas cantando e dançando, além de realizarem verdadeiras encenações. É a partir dessas manifestações que essa cultura ainda permanece viva entre nosso povo. Toda essa cultura, que os povos indígenas que aqui habitavam antes da chegada de Pedro Álvares Cabral e, principalmente suas manifestações dramáticas, denomina-se de Teatro Pré-Cabralino.

domingo, 5 de fevereiro de 2023

CARTA A UMA AMIGA

 Cara amiga Ana Paula,

     Paro e penso para refletir pausadamente numa resposta sobre a qual me perguntas: “– Como justificar nossa existência?”. O que me veio à memória em função da tua indagação fez-me exercitar minhas instigantes adrenalinas e meus plácidos neurônios...! Também serviu como exemplo a mim mesmo, para refletir profundamente sobre o pensar...! O que eu penso...! E ainda, o que eu penso sobre o que você pensa...!

     Esforcei-me ardorosamente como um andarilho viajante, para conseguir interpretar esse tão grande enigma desta oculta e serena esfinge, que dilacera os corações dos pobres mortais. Por conseguinte, eis aqui as mal traçadas linhas, às quais, consegui desenvolvê-las em estado de letargia, em função da tua tão cautelosa insistência.

     A morte só é interessante porque ninguém ainda conseguiu decifrá-la. Só há vida porque há morte. Apesar de parecerem opostos extremos, acredito que vida e morte estão ligadas por um fio. Assim, também funciona com a tragédia e a comédia. Deus só existe em função do Diabo. O bem está entre nós, em constante luta contra o mal. O pecado existe para ser perdoado. Sem o perdão, o pecado não teria razão de ser. Lembre-se que os músculos que nos fazem chorar, são os mesmos que nos proporcionam risos e gargalhadas. Quando a sensibilidade é plena, estamos sujeitos a verter lágrimas tanto ao rir quanto ao chorar.

     Portanto, minha querida Ana Paula, entre tantas interrogações e perquirições, estou cônscio de que o melhor para a existência é viver o aqui e o agora. Carpe diem...! Viver os momentos e os segundos! Aproveitar esta dádiva que é a vida, e o ciclo vital nos proporciona. Fundamental é refletir os momentos difíceis para soerguer e seguir a vida plenamente. O essencial é viver a vida em paz e valer-se intensamente dos momentos alegres e prazerosos...! Estes sim, nos engrandecem introspectivamente, alimentado o nosso espírito (se é que ele existe?), torna grande nosso eu, representado na individualidade metafísica de cada ser humano.

     Tanto tempo que nós nos vemos, e jamais pensei que eu fosse me aproximar de você, assim como está naturalmente acontecendo. Você tem alguma explicação para isso? Eu também não...! Só sei que a vida é cheia de surpresas...! E quando a surpresa é boa não deveremos desperdiçá-la...!

     A nossa existência caminha em função dos encontros e desencontros, porque a vida, o mundo e o espaço sideral, são dialéticos. Também somos dialéticos, levando-se em consideração que nosso corpo muda a cada instante. Heráclito de Éfeso, filósofo pré-socrático já dizia: “– Ninguém pode entrar duas vezes nas águas do mesmo rio”, visto que o rio está em constante mudança. Mais ainda, porque também o está quem nele mergulha. Há que imaginar que tudo flui e nada dura infinitamente.

     Sendo assim, nossa existência se justifica em função de que tudo é dialético...! Até no que é estático há vida, como a areia e as pedras que se nos apresentam inertes. Como entender que por durante anos e anos, os pigmentos da areia penetram lentamente e pacientemente no corpo de um peixe esquecido ao relento e o transforma em pedra? O conhecido fóssil!

     René Descartes, filósofo e matemático francês, afirmou: “– Cogito ergo sum”. Penso, logo existo. Karl Max, com o seu materialismo histórico nos revela que “não é a consciência que determina o ser, mas, o ser social é quem determina a consciência”. No existencialismo, Jean Paul Sartre, considera cada homem como ser único que é mestre dos seus atos e do seu destino, defendendo que “a existência precede a essência”. Assim sendo, minha cara amiga, aparo-me no refúgio do “eterno retorno”, do filósofo alemão Nietzsche; e com sabedoria lhe devolvo a pergunta à qual, você me indagou inicialmente: “– Como justificar nossa existência?”. Beijo e abraço apertado.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

ICONOCLASTAS

 


     O Brasil e o mundo ficaram estarrecidos, com os acontecimentos que aconteceram em Brasília, no dia oito de janeiro deste ano. Interessante que na eleição de 2018, quando a direita assumiu o poder, por sua vez, a esquerda ficou na dela, e aceitou com calmaria, e em função do processo democrático, aceitou o resultado das urnas eletrônicas, visto que o presidente havia sido eleito pelo voto da maioria. Fato é que durante os últimos quatro anos do governo anterior, nenhum movimento insurgente foi realizado pelos mais variados grupos políticos de esquerda do nosso país.

     Mas o que nos move a escrever sobre tal fato, não é tão diretamente em relação à política partidária propriamente dita, mas sim, aos estragos: moral, econômico, social, artístico e cultural, pelos quais, vem sendo atacado a sociedade e o povo brasileiro. Além de todos esses fatos que vimos observando na cena nacional, e que vem amplamente sendo informado pela mídia, nos resta aqui, nesses poucos parágrafos, nos voltar para uma questão importantíssima que é a destruição de obras artísticas de valores incomensuráveis, para a história e cultura do nosso povo.

      Desde primórdios, a arte acompanha o homem ao longo de sua história, ela, a arte, está intrinsecamente ligada à vida de um povo e reflete a essência de uma nação, seus atos e fatos, suas conquistas e suas perdas. É um dos meios de comunicação mais antigo da história. Em muitos casos, é a partir de objetos artísticos deixados pelos nossos ancestrais que podemos conhecer costumes e vida de povos antigos. 

     Portanto, entendo que uma obra artística é o retrato de um povo, de uma cultura, de uma sociedade e merece ser integralmente preservada. Para isso, os museus estão plenos de obras de arte, seja relacionada à arquitetura, pintura, escultura, ou ainda, das demais formas artísticas. Infelizmente, aqueles que não entendem a linguagem artística, não percebem o grande legado que, ao longo da história do homem, a arte vem nos transmitindo e nos revelando  como viviam os nossos antepassados, o que nos deixa esse grande presente que se torna patrimônio de todos e, portanto, universal.

     Iconoclasta é um substantivo masculino e feminino, que demonstra a pessoa que estraga ou destrói imagens religiosas, símbolos da pátria, monumentos artísticos, entre outros, podendo ser sinônimo de vândalo. Diz-se daquela pessoa que é sectária da iconoclastia, que destrói imagens ou estátuas, que não respeita os costumes e as tradições. Isto posto, além de todo tipo de adjetivo, os invasores dos três poderes também devem ser tratados como iconoclastas.

     Para se ter uma ideia, as obras que foram fortemente atacadas no dia oito de janeiro em Brasília e que são de inestimável valor, são as seguintes: Tela de Di Cavalcanti; “O Flautista”, de Bruno Giorgi; “Bandeira do Brasil”, de Jorge Eduardo; “Galhos e Sombras”, de Frans Krajcberg; “Relógio” de Balthazar Marinot; “A Justiça”, de Alfredo Ceschiatti; “Muro Escultórico”, de Athos Bulcão; “Bailarina” de Victor Brecheret; “Escultura Maria, Maria”, de Sônia Ebling, entre outras.