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segunda-feira, 25 de março de 2024

45 ANOS DE UMA CRUZ PARA JESUS

 

 

     Com uma vida dedicada ao teatro do Amapá, o ator e diretor de teatro Amadeu Lobato merece meus cumprimentos e minhas felicitações, em função de sua persistência e dedicação exclusiva à sua tradicional montagem do espetáculo “Uma Cruz para Jesus”, que neste ano de 2024, inusitadamente, está completando seus 45 anos em cartaz. É bom lembrar que, no Brasil, são poucos os grupos de teatro que permanecem tanto tempo em cartaz, como exemplo, José Pimentel que passou mais de 40 anos representando a Paixão de Cristo, em Nova Jerusalém, Pernambuco.

     A primeira apresentação que aconteceu no ano de 1979, teve apoio da Igreja Católica, e consequentemente, nesses quarenta e cinco anos à frente, como diretor da Companhia Teatro de Arena, Amadeu Lobato transformou seu trabalho num espetáculo ontológico e clássico do Amapá. Uma peça em que não se paga ingresso, onde o acesso é livre para o público em geral, sem discriminação de cor, etnia, religião e classe social. Todos podem assistir ao referido espetáculo, e para isso, basta se dirigir na sexta-feira santa, ao teatro ao ar livre que existe na lateral norte da Fortaleza de São José de Macapá, no centro da cidade. 

      Para aqueles que acompanham essa trajetória, basta imaginar que são 45 anos de resistência em relação ao fazer teatral nas terras tucujus. Amadeu Lobato é nosso grande Mestre do teatro amapaense e transformou seu espetáculo numa considerável escola de teatro ao ar livre, visto que significativa parte dos artistas do Amapá, pela primeira vez, subiram ao palco, nesta escola. Também não é para menos, sua peça coloca em cena, todos os anos, mais de cem atores e atrizes, concentrados num espetáculo de um pouco mais de uma hora, na área externa da Fortaleza.

     Uma Cruz para Jesus significa a vitalidade e a persistência do teatro amapaense. Hoje não se pode falar desta peça sem citar o nome de Amadeu Lobato. Ao longo de quatro décadas houve um hibridismo entre o criador (Amadeu) e a criatura (que é seu espetáculo).  Por isso, esse trabalho e essa dedicação do Amadeu Lobato, já é referência tanto na sociedade amapaense quanto dentro da academia voltada para estudos culturais.

         Nesses últimos 29 anos tenho acompanhado de perto a obra desse avultado Mestre, e foram muitas as vezes que seu trabalho foi montado com garra, coragem e decisão, e o mais importante é que o público sempre esteve lá, literalmente de pé, vendo a ficção e aplaudindo na realidade, os passos de Jesus Cristo Salvador. Amadeu Lobato é um sujeito de fé, com muita determinação, objetivo e metódico, não fosse essas qualidades, seu espetáculo já não mais existiria.

     Seguramente posso citar aqui algumas influências de “Uma Cruz para Jesus” nestes 45 anos de atividades ininterruptas. No entanto, é em função deste espetáculo que se disseminou vários outros grupos que passaram a apresentar seus espetáculos sobre a vida, paixão e morte de cristo. Bairros como: Perpétuo Socorro, Pacoval, Novo Horizonte, entre outros também fazem apresentação sobre a vida de Cristo. Em função de todo esse trabalho, por toda sua contribuição para o teatro do Amapá, Amadeu Lobato merece nosso respeito. Parabéns meu amigo, parabéns por sua resiliência e persistência nesses últimos 45 anos de apresentação de “Uma Cruz para Jesus”.  O teatro do Amapá agradece sua dedicação e espírito dionisíaco.

 

 

 

 

segunda-feira, 18 de março de 2024

PASSOS DO HERÓI

 

 

     Basicamente, se olharmos para todo herói, iremos perceber que há muita coisa de semelhante, principalmente no que diz respeito à sua trajetória, à sua história; visto que todos eles seguem o mesmo enredo, o mesmo caminho ou a mesma saga. Quem já assistiu um filme de western ou bang-bang, sabe disso! Inicia-se quando, geralmente, nasce numa família muito humilde. Possui força sobre-humana precoce; e de acordo com seu desenvolvimento, consegue rápida ascensão ao poder, além de muita notoriedade. Torna-se defensor da justiça e cheio de virtudes, e na sua trajetória final, ou morre ou se torna herói reconhecido pelo seu povo.

     O herói geralmente, sai do seu mundo comum, passa por um mundo diferente e desconhecido, e retorna ao seu mundo comum, como verdadeiro herói. Como isso acontece? Vejamos: primeiramente há um chamado para a aventura, uma mensagem ou um convite de alguém, na verdade um desafio que ele deverá aceitar, ou não. Aqui, ele ainda está em seu mundo cotidiano. Para sua difícil decisão, sai em busca de alguém mais sábio, um oráculo, talvez! Em busca de conselhos e ajuda. Em função de sua decisão, segue seu rumo, cruzando o portal do seu mundo normal, seguro e tranquilo, e adentrando num mundo especial, desconhecido e cheio de provações e aventuras.

     Já no mundo completamente misterioso, o herói terá que passar por testes e provações; e este é o momento em que muitas situações adversas possivelmente irão acontecer, como, por exemplo, escapar de uma armadilha, descobrir o enigma e matar um monstro. Lembremos da saga de Ulisses no seu retorno à Ítaca; em Édipo Rei, quando mata a esfinge, ou ainda os 12 trabalhos de Hércules. E aí, chega a hora de encarar a maior provação, que se torna o maior temor do herói, mas que inevitavelmente ele terá que enfrentar tais situações. Este é o mais difícil momento do herói, tendo em vista, que ele, enfrentará a morte, e poderá matar o monstro ou até mesmo morrer.

     Ao vencer todas as suas provações, com certeza, o herói exige um prêmio, uma recompensa, algum tesouro, ou poder, como aconteceu com Édipo, que se tornou rei de Tebas. No desfecho de sua caminhada, o povo se curva respeitosamente diante do herói e o transforma em rei ou pessoa importante. Portanto, há várias formas de se decidir o desfecho final. Então, chega o momento do herói sair do seu mundo especial, e retornar ao seu mundo normal, já como herói reconhecido. Acontece que, depois de toda essa aventura, ele retorna a seu mundo normal, rejuvenescido e com uma nova vida. Foi preciso todo esse desenlace para que o mesmo se tornasse um herói. Seu gesto, sua decisão e sua atitude o transformaram em herói. 

     Em função de que todas as tramas foram resolvidas, o herói volta ao seu mundo cotidiano, mas com um nível mais elevado, já não é mais o mesmo, deixando de ser algo comum, para ser um herói. Isso também acontece com o personagem Flick, herói do filme “Vida de Inseto”, Édipo, na peça “Édipo Rei”, de Sófocles, como também fica muito claro no personagem “Ulisses” da “Odisseia”, e ainda, vamos encontrar esses heróis em muitos filmes populares. Esta é a jornada do herói.

 

quarta-feira, 13 de março de 2024

PROFESSORA VERÔNICA É CIDADÃ AMAPAENSE

 

 

     Na última segunda-feira, dia 4 de março, a Professora aposentada Doutora Verônica Xavier Luna, da Universidade Federal do Amapá, recebeu da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá, o Título de Cidadã Amapaense, numa homenagem do Deputado Estadual Jory Oeiras. Desde muito jovem, Dra. Verônica se dedicou ao magistério, quando ainda não tinha habilitação específica para trabalhar como professora, mas apenas como diletante da arte de ensinar. Aos dezesseis anos já atuava no ensino primário, escala que foi aumentando à medida que foi adquirindo sua formação superior.

     Ao chegar à região Norte, na qualidade de professora concursada da Universidade Federal do Amapá e docente do Curso de História, sua vivência no Amapá foi despertando seu interesse pela cultura local, religiosidade e a formação social do seu povo. Ao se familiarizar com as comunidades afrodescendentes do Amapá, foi motivada por esse novo mundo, o que a levou ao compromisso acadêmico tendo como ponto de partida a sociedade amapaense. A partir de seus estudos, publicou em 2011, a obra intitulada “ESCRAVOS EM MACAPÁ”, que foi resultado da conclusão de seu Mestrado. 

     Com o passar dos anos, em suas pesquisas Dra. Verônica afirma ter-se debruçado sobre extensa literatura, partindo de autores locais e regionais. Além de entrar em contato com a historiografia local, à qual, revelou uma história mais política da região, ela também participou de vários encontros que debatiam essa temática. O estudo da professora aprofunda o alargamento da formação social dos trabalhadores africanos cativos na Vila de Macapá, tendo como perspectiva a formação social e histórica em suas diferentes dimensões, voltados para o debate acadêmico da história da Vila de Macapá.

     A professora passou a apreender práticas da cidade no início dos tempos republicanos, delimitadas por uma temporalidade também passada/presente. Sendo assim, realizou atividades em instituições públicas de Macapá: como exemplo: no cartório Jucá, no Tribunal Judiciário do Amapá (TJAP), Biblioteca Pública Elcy Lacerda, e ainda no arquivo da Cúria de Macapá. Essa atividade contou com a colaboração de alunos da especialização e da graduação em história da UNIFAP. Em 2020, publicou a obra “UM CAIS QUE ABRIGA HISTÓRIAS DE VIDA – Sociabilidades Conflituosas na Gentrificação da Cidade de Macapá (1943 a 1970).

     Como professora da Universidade Federal do Amapá, criou o Centro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas – CEPAP; como também o Centro de Memória, Documentação Histórica e Arquivo – CEMEDHARQ/UNIFAP. Mesmo aposentada atua em prol do salvamento dos acervos documentais do Estado do Amapá, com intuito de garantir a preservação e guarda da memória e identidade histórica local. Salvou a Memória da Briosa Guarda Territorial e a transformou em livro, que teve como resultado a obra “MEMÓRIA DA BRIOSA GUARDA TERRITORIAL DO AMAPÁ”, livro que foi lançado no dia 21 de setembro de 2023. Atualmente continua investindo na guarda de memória de atores sociais locais. 

                                                                                    Prof. Dr. PALHANO.

terça-feira, 5 de março de 2024

FUTLAMA

 

 

     Uma das características culturais da cidade de Macapá é o conhecido FUTLAMA, que vem sendo realizado e apreciado pela população há muitos anos. É uma criação dos amapaenses aficionados ao futebol, não profissionais, mas que não têm acesso a grandes estádios. Essa mania de jogar futebol nas areias do rio amazonas, quando o mesmo está de maré baixa, ganhou espaço na cidade, visto que já existe até campeonatos de futlama. Seguindo a principal lei dos povos dessa região insular, tudo está submetido ao grande rio amazonas, em função da sua tábua de marés. Isso mesmo...! É o fluxo da maré quem determina o horário de partida e de chegada. É a maré quem define o horário do vai e vem de pessoas e mercadorias dessa região. Frente a isso, o Futlama também não poderia fugir a essa regra, por isso mesmo ele sempre acontece com a maré baixa.

     O que inicialmente era um momento de prazer e lazer de antigos pescadores, os quais, precisavam relaxar após o árduo trabalho, tomou corpo e na atualidade, todos os anos vem acontecendo o campeonato de futlama defronte à cidade, na ocasião da maré baixa. Ao longo dos anos, certamente, houve vários avanços em relação à essa atividade cultural no Amapá. No ano de 2003, se deu o primeiro torneio de futebol de lama do Brasil. Já em 2007, houve a fundação da Federação Amapaense de Futlama. Como tudo na região Norte está sujeito às forças da natureza, da mesma forma que os jogos acontecem na maré baixa, em vários casos, a força das águas, faz com que a partida termine antes do tempo previsto. Não é à toa que, praticamente todos os anos, em função da força das águas, entre março e abril, acontece as marés lançantes quando a orla de Macapá fica completamente inundada, sendo batizada e purificada pelas águas do grande rio.

     Outro dado interessante, é que as agremiações sempre homenageiam a própria região colocando nomes específicos da fauna e flora amazônica, como: Tralhoto, Vitória Régia, entre outros. Essas atividades culturais já fazem parte do Patrimônio cultural da cidade. O que se pode observar aqui, é a persistência e resiliência de uma comunidade de cidadãos que a partir, de sua atuação, busca conquistar um sentido de pertencimento ao grupo de amigos, à cidade e, respectivamente, ao Estado do Amapá.  É extremamente necessário que os órgãos de cultura se voltem para a motivação e proteção de atividades culturais desse gênero, principalmente quando surge de classes menos favorecidas. Ao longo da história pode-se observar alguns casos como por exemplo, o próprio samba, que foi perseguido, aqui no Brasil, a valsa, na Argentina. Em seu início, essas manifestações foram rechaçadas pela elite, mas, que se tornaram patrimônios desses países.

     O que me fez escrever este artigo sobre o Futlama de Macapá, foi em função de meu retorno à Macapá, no início de janeiro do ano em curso, quando da leitura de uma matéria sobre essa beleza de manifestação cultural da nossa querida cidade. A referida reportagem encontra-se na revista de bordo, nº 236, de novembro/dezembro/2023, da empresa aérea Gol, com início na página 32, e término na página 37. Ao ler tal reportagem fiquei muito feliz de ter visto uma notícia tão importante numa revista que é lida por centenas de brasileiros.  

ARTE E EDUCAÇÃO

 

 

     Muito se tem enfocado sobre a questão do ensino de artes nas escolas, o que é importante saber é que desde os primórdios que a arte está presente, mesmo que não tenha sido no currículo propriamente dito, mas, na prática sempre existiu. Na minha passagem pelo curso ginasial, na década de 1970, por exemplo, já havia aulas de música, pintura e dramatização, como também, professores formados nessas áreas da arte. Vejamos os primórdios do processo do ensino de artes nas escolas.

     O ensino de artes nas escolas não é tema da atualidade, ao contrário, é assunto extremamente antigo. Tudo começou com o desenho. Clara herança do passado é o persistente desejo oficial de justificar a arte, ou como era chamada nos primeiros tempos, o desenho. Jack Cross, em seu livro “O Ensino de Artes na Escola”, afirma que: “um jovem cavalheiro que soubesse desenhar poderia, com sua habilidade, suplementar o próprio diário; a escola oferecia os serviços do professor de desenho como vantagem opcional, mediante uma taxa adicional”.

     Praticava-se também o desenho de letras. Não só de escrita caligráfica, mas também de maiúsculas decorativas. Percebe-se claramente que a arte se resumia ao desenho de letras e cartazes. Aproximadamente, no século XIX, em muitos planos de trabalho, surgiu uma disciplina rotulada de treinamento manual, treinamento das mãos e dos olhos, trabalho manual, artesanato ou arte aplicada.

     Nas escolas da Inglaterra, França e outros países europeus, predominavam no século XIX, influências de ideias liberais e positivistas que resultavam na sua utilização como uma modalidade aplicada em ornamentos e preparação dos operários. A partir de 1837, foram criadas “Escolas de Desenho” na Inglaterra, para atender aos princípios e práticas artísticas de ornamentação, decoração e manufaturas.

     Na mesma época, nos Estados Unidos, os filhos das classes média e média alta, aprendiam em escolas particulares a copiar reproduções famosas, perspectiva linear e desenho geométrico. Com isso, podiam reconhecer as obras de arte originais dos grandes mestres e não comprar trabalhos falsos. Por outro lado, os filhos dos operários frequentavam a escola pública, onde aprendiam desenho geométrico e desenho linear, destinados a serem usados em seus futuros trabalhos nas fábricas.

     No Brasil do século XIX, o desenho passa a ocupar um espaço equivalente ao do mundo em industrialização, o que fica bem evidente no parecer feito por Rui Barbosa sobre o ensino primário em 1883, onde relaciona o desenho com o progresso industrial.

     Já nas primeiras décadas do século XX, continua visível, junto às classes sociais mais baixas, a analogia entre o ensino do desenho e o trabalho, como se observa nos programas de desenho geométrico, perspectiva, exercícios de composição para decoração e desenho de ornatos.  Estes, orientados exclusivamente para cópias de modelos que vinham geralmente de fora.