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domingo, 22 de outubro de 2023

O DITIRAMBO E O MARABAIXO

 


     O culto a Dioniso, deus da uva e do vinho, com seu canto ditirâmbico, remonta há mais de mil anos antes de cristo, nele, havia dança, música, pessoas gritando e cantando e ingeria-se muito vinho. Acontecia em homenagem às vindimas (período da colheita da uva).  Havia ainda o corifeu, que puxava um refrão, enquanto as pessoas respondiam.

     Apesar da distância cronológica, da tecnologia e do mundo contemporâneo, há muita semelhança entre o canto ditirâmbico e o marabaixo. Os praticantes do marabaixo dançam ao som de caixas confeccionadas de madeira; dançam em círculo em torno dos caixeiros, da mesma forma que as pessoas dançavam em círculo a partir de determina música no entorno do deus Dioniso; respondem em coro o “ladrão” tirado pelo cantador, praticamente representando o papel do corifeu (que fazia o mesmo) no antigo culto grego.

     Muitas vezes esses “ladrões” transforma-se em desafios improvisados, o que nos remete à Odisseia e propriamente ao cordel, como também aos desafios dos emboladores de coco. Em sua tese de doutorado, intitulada: “Marabaixo, ladrão, gengibirra e rádio – Traduções de linguagens de textos culturais”, defendida em 2012, na Pontífica Universidade Católica de São Paulo, (da qual fui arguidor) Prof. Dr. Rostan Martins afirma que: “Alguns versos de ladrão contam gozações, reprovações ou alguns lapsos cometido por uma autoridade ou pessoa da comunidade, reproduzem cenas hilariantes do cotidiano”. Isso demonstra a versatilidade da dança do marabaixo.

     O improviso é constante no marabaixo, o que também era muito utilizado no canto ditirâmbico, e foi exatamente a partir do improviso de Théspis (considerado o primeiro ator ocidental), quando gritou: “eu sou Dioniso”, que aquele culto iniciou sua transformação cultural revelando numa outra forma de manifestação conhecida por teatro.

     Acredita-se que o círculo é uma das formas mais perfeitas, e independente de área geográfica ou relação temporal/cronológica, sempre aparece em várias latitudes do planeta e nas mais diversificadas comunidades ancestrais, modernas e contemporâneas. Na Grécia clássica, o canto ditirâmbico acontecia em círculo; a ciranda também é em círculo; o coco de roda, o próprio nome já nos sugere sua forma; a maioria dos passos da quadrilha junina é em círculo; evidentemente, que o marabaixo também não poderia ficar de fora dessa regra secular. 

     De uma forma ou de outra, percebe-se que fatores religiosos também se encontram inseridos nessas manifestações, em cada latitude como também em cada seu momento histórico, e que consequentemente, merecem o respeito dos estudiosos, dos catedráticos, do povo e principalmente da própria comunidade em que essas manifestações se revelam. O marabaixo representa o símbolo da cultura amapaense. E foi esta dança que Luiz Gonzaga dançou e gravou: “Eita, seu mano que bom, ai! Que bom de dançar! Eita seu mano que bom, ai!, que bom é o Macapá”, referindo-se à dança do marabaixo.

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