Local místico, centro das atenções de uma
comunidade; local de encontro, de alegria, de conversas e de trabalho cotidiano.
Recanto preferido onde a criançada fazia e inventava seus próprios brinquedos e
brincadeiras. Lugar versátil: piscina, rio, mar, praia, verdadeiro e principal
ponto de lazer da comunidade local. Observo que nos tempos idos, o igarapé das
mulheres, não significava apenas o que era...! mas, metaforicamente, também se
assemelhava a um grande shopping a céu aberto. Ponto e porto de chegada e saída
de mercadorias, movimento intenso de barcos, o que ainda acontece na
atualidade. O igarapé das mulheres mais parece um centro geológico dotado de
magnetismo, tendo em vista que tudo se vê atraído por aquele lugar. Barcos,
pessoas, mercadorias, crianças, homens e mulheres. Entretanto, parece-me que a
mágica e o intensivo magnetismo existente naquele recanto, atraía mesmo as
mulheres lavadeiras de roupa.
Época remota, em que as mulheres eram
totalmente atraídas para aquele espaço sentimental, para lavarem suas roupas e
de suas famílias, nas águas daquele inefável igarapé. Berço de uma cultura, área
de encontro social, sítio arqueológico, ponto de encontro e de comunicação
entre as comunidades ribeirinhas. Apesar de não haver mais mulheres lavando
roupas, hoje o igarapé das mulheres continua firme como ponto de chegada e partida
daqueles que permanecem perpetuando o ciclo de sua relação com o rio, a água e
os ribeirinhos da grandiosa Amazônia. Todo lugar, toda cidade, vivencia seus
momentos de ascensão e decadência. Embora, na atualidade, praticamente, o local
seja impróprio para banho, de certa forma, continua a servir como porto
fluvial, onde pequenos barcos mercantes o utilizam, num vai e vem permanente.
Esse meigo olhar que exige cuidados
ambientais e de preservação, ao longo de décadas, não foi tão bem visto como
deveria ter sido, pelos administradores e pela sociedade em geral. Mas, a arte
nos salva dessa falha, dessa hamartia. Ela vem e eleva aquele lugar no seu mais
sublime grau de grandiosidade estética. E a manutenção da fidelidade e beleza artística,
clássica, literária e lírica vamos encontrar nos versos da música “Igarapé das
Mulheres” do cantor e compositor Osmar Júnior. Em seus versos, significantes e
significados, ao mesmo tempo, estão inseridos e latentes, revelando como num
soneto musical, pequenos textos, contextos e pretextos que nos levam definitivamente,
a compreender o jeito de ser tucujú. Ele inicia seus versos afirmando, como um
verdadeiro filósofo, que o tempo leva tudo, o tempo leva a vida, o que
nos remete ao célebre sábio grego Heráclito de Éfeso.
Utilizando-se de figuras de linguagem,
como metáfora e comparação, Osmar Júnior descreve aventuras, em meio às suas
alegrias, dúvidas e tristezas, ao enfrentar as vicissitudes da vida, com seu
olhar pretérito de criança, para um futuro-mais-que-perfeito...! E continua seu
texto revelando pontos extremos e pensamentos opostos, quando relaciona sua
alegria ao boiar nas águas, enquanto as margaridas lavadeiras lavavam a dor,
assim, fica claro que nessa passagem, satisfação e descontentamento caminham
juntos. Em seu texto, quase lamento, o compositor permanece na dúvida
existencial, de crescer e se tornar adulto, enfrentar o medo do mundo, com sua
esperança perdida. Nesse hiato, seu refúgio para seguir em frente e criar
coragem de retirar as pedras do meio do caminho, foi encontrado ao refletir
sobre a difícil vida e destemida coragem das mulheres lavadeiras, margaridas, severinas,
joanas e marias; enfim...! buscou persistência e resiliência nas despretensiosas
deusas do igarapé das mulheres.
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