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segunda-feira, 4 de julho de 2016

ENSAIO A RICARDO III DE SHAKESPEARE


     “O inverno do nosso desgosto se fez verão glorioso”. Estas são as palavras faladas quando o personagem Ricardo III imagina perspectivas concretas de sua futura coroação. São metáforas, verdadeiras e atuais. Refletem e conotam ao mesmo tempo: demagogia, egoísmo, despotismo, egocentrismo e poder absoluto! Frase célebre que significa, em um só tempo: passado, presente e futuro. É o reflexo das irreflexões humanas. É a síntese; o resumo do próprio homem enquanto ser existencial, em busca de sua verdade.
     É no Renascimento onde podemos encontrar um dos dramaturgos mais importante da Europa. Especificamente na Inglaterra, sob o período Elisabetano, viveu Williams Shakespeare, de 1564 a 1616. Nesse período a Inglaterra encontrava-se em crescimento econômico muito promissor. A rainha Elizabeth havia conquistado a hegemonia da sociedade inglesa, que, por sua vez, estava submersa em suas contradições éticas, morais e sociais e mergulhada nos seus valores burgueses.
     Na pequena cidade de Stratford-on-Avon, a 80 quilômetros de Londres, Shakespeare passou boa parte de sua vida, onde estudou vários idiomas. Posteriormente, abandona a família e vai para a cidade grande (no caso Londres) onde, em poucos dias gasta suas economias nos bares e teatros da cidade. Aliás, esse foi praticamente o grande universo de Shakespeare: Stratford-Londres Stratford.
     Diante de um teatro (provavelmente o Globe Theatre), durante as apresentações, sem mais poder assisti-las, e para sua sobrevivência, passa a guardar e cuidar de cavalos do público presente. O certo é que após um certo período, ele passa a trabalhar nesse mesmo teatro. Inicialmente como tradutor de textos já que sabia vários idiomas, (trabalho que lhe deu suporte significante em sua futura obra, tendo em vista que à medida que fazia as traduções, paralelamente, ia compreendendo a carpintaria teatral dos referidos textos).
     Com o seu crescente conhecimento, conseguiu uma vaga como ator e nesse mesmo teatro se tornaria famoso ao montar seus próprios textos. No Globe Theatre, as peças de Shakespeare foram encenadas a partir do ano de 1599. Como dramaturgo, foi de encontro a paradigmas como as unidades aristotélicas, criando tragédias que não seguiam as unidades de tempo, lugar e ação. Trouxe para o palco questões éticas e morais da sociedade inglesa da época.
     Uma das questões fundamentais de sua obra é que ao invés da tragédia grega que enfocava a luta do homem com os deuses; com um toque metafórico, sua obra revelou a luta do homem contra o próprio homem. O que ele levou para o palco, já não eram os deuses, mas a crescente burguesia inglesa lutando contra si, em busca de resolver seus próprios problemas. Romeu e Julieta é um bom exemplo do que se trata aqui.
     O existencialismo humano e uma das questões fundamentais que denota a atualidade da obra de Shakespeare. Esta é uma das razões que faz com que sua obra seja estudada e reverenciada até nossos dias e que seus textos sejam geralmente montados em latitudes totalmente diferentes, com: “Hamlet”, “Macbeth”, entre outros.
     “Ricardo III”, que é o que mais nos interessa neste momento, já foi encenado infinitas vezes nesses últimos séculos. Para imaginarmos a grandiosidade da obra desse autor, basta dizer que este último texto já rendeu discussões, teses, estudos diversos, e como não poderia de ser também foi transformado em vários filmes.
     Tratando-se de cinema, quantos cineastas transformaram em filme a obra de Shakespeare? Sabe-se que não foram poucos os filmes; não só de sua obra, mas também sobre sua vida. É oportuno enfocar que “Ensaio Sobre Ricardo II” de Al Pacino é um deles.
     Este filme, nos leva a uma porta aberta à medida que não se resume apenas como um filme qualquer. É um documentário, é teatro no cinema, são pessoas anônimas que estão na rua e que contribuem com vários pontos de discussão (mudanças) para que possamos refletir objetivamente sobre o autor, sem esquecer a obra, “Ricardo III” que é o tema do filme.
     A todo tempo, o referido filme se transforma num jogo; um jogo em que os participantes refletem sobre Shakespeare, deixando sempre um espaço vazio, para novas reflexões. É o cinema buscando preencher seus espaços, seus meta-espaços. O enfoque é um grupo de teatro, mas a arte é cinema; é cinematográfica. Neste caso, não vamos ao cinema para ver “Ricardo III”, mas para conhecer Shakespeare e consequentemente, pensar “Ricardo III”. Com esse viés, Al Pacino põe em discussão uma das obras mais importantes do autor renascentista.
     No filme, um grupo de teatro decide montar “Ricardo III”. Essa é a trama, que não se deixa cair nos fios do tempo, buscando pesquisar para compreender, e poder explicitar mais profundamente para o espectador, a obra do autor.
     Não se trata de cinema pelo cinema, Al Pacino faz do seu “Ricardo III”, um filme que, antes de se preocupar com a montagem, seu objetivo foi estudar o autor. E não só isso, ele não se contentou que seus espectadores entendessem apenas o tema, no caso “Ricardo III”, mas se preocupassem também com o dramaturgo. Portanto, é de fundamental importância esse ângulo “Paviniano”, quando nos referimos à arte como um universo macro. Assim, Al Pacino, em “Ricardo III”, tenta preencher todos os espaços possíveis no âmbito do cinema, quer dizer, no âmbito do filme.

     No final dessas elementares palavras, poderíamos imaginar a seguinte frase: “Um cavalo... Meu reino por um cavalo...”, dita e redita simbolicamente por um homem (político, empresário, milionário, etc.), neste século XXI, num momento difícil de sua existência pessoal; da mesma forma e no mesmo tom, como falou Ricardo III, há cinco séculos.

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