Meu
pai era ferroviário e exercia a função de serralheiro, o que, na época, era o
mesmo que mecânico. Desenvolvia suas atividades profissionais na oficina de
trens de Itabaiana, pequena cidade do interior da Paraíba. Quando o trem
chegava de outro destino ou quando iria prosseguir viagem, tinha que passar pela
oficina para uma revisão geral. Nesse seu trabalho, aprendeu a pilotar tanto a
máquina a vapor, antiga Maria Fumaça, ou máquina preta, como também a máquina à
diesel, ou máquina vermelha, como ele próprio chamava.
A base inicial da ferrovia foi a máquina à
vapor. Vários apetrechos eram necessários para fazer aquelas máquinas funcionarem:
terra, fogo, água, ar, madeira, maquinista e foguista. Havia grandes armazéns
abarrotados daquela areia branca e fininha que se usa em construção civil. Em
caso de necessidade, como por exemplo, numa subida, aquela areia era usada para
criar o atrito das rodas com os trilhos
A madeira gerava o fogo necessário para
ferver a água da caldeira e fazer a máquina funcionar. O papel do foguista era
manter a temperatura ideal do fogo na fornalha para fazer a água entrar em
estado de ebulição e criar o vapor suficiente para fazer a máquina andar e
apitar, entre outras coisas. O maquinista era aquele profissional que pilotava
a máquina. A tecnologia da máquina a vapor exigia que nas estações se
construíssem imensas caixas d’água.
Meu pai foi o meu primeiro mestre, certa
vez lhe fiz esta pergunta: - Pai, como o senhor consegue consertar uma máquina
tão grande? Ele me respondeu: - Meu filho, a máquina é muito grande, mas é
feita de coisas pequenas como parafusos, arruelas. entre outras coisas
pequeninas. Por exemplo, a máquina preta possui um recipiente na frente das
rodas dianteiras, cheio de areia, ela tem um dispositivo que quando o
maquinista puxa, a areia cai sobre os trilhos fazendo com que a máquina tenha
mais aderência das rodas com os trilhos para não derrapar numa subida. Isso é apenas
uma parte da máquina, algo pequeno, mas que é parte de um todo. Fiquei
encantado com a resposta que ele me deu e passei a discernir melhor a parte do
todo; passei a perceber melhor o sentido da vida.
Quando surgiu a máquina à óleo diesel
ainda na década de 1970, todo aquele aparato básico para manter a máquina a
vapor foi ficando obsoleto. A máquina à diesel só precisava de um combustível, óleo
diesel, e claro, a manutenção cotidiana. Várias e várias vezes eu entrava
dentro dessas máquinas com meu pai. O que mais me impressionava é que elas
possuíam um virabrequim maior do que um homem. Além do trabalho, os ferroviários apreciavam
muito a bebida e o tabaco. Meu pai não
bebia, mas gostava muito de um rapé. Ele passou a usar o rapé em função do seu
próprio trabalho. Ele estranhava e não se sentia bem ao entrar numa máquina com
a temperatura extremamente alta, e sair em seguida, para enfrentar uma
temperatura externa muito mais fria. Fato que aconteceu no início de sua
carreira na Rede Ferroviária. Em função disso foi se informar com um colega
veterano: o mesmo, informou a meu pai que um bom remédio seria cheirar rapé.
Assim, enfrentaria com mais tranquilidade o choque térmico. A partir daí meu
pai começou a cheirar rapé que era feito a partir do Tabaco. As histórias do
meu pai, em muito me encantavam e me ensinavam. Suas histórias e suas
lembranças, não se destroem com o tempo, portanto, para mim, meu pai é meu
eterno herói.
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